Um lançamento importante e que traz realidade em uma mistura que no final vira arte. Foi assim que Monkey Jhayam apresentou seu novo trabalho, uma volta à cena com um novo single de sonoridade glocal.
Este termo – neologismo resultante da união de global e local – descreve bem a faixa “Afrochoque”. É o choque de culturas genuínas e tradições locais com o que há de mais globalizado. Para chegar nesta sonoridade ímpar o cantor e compositor se uniu aos produtores Dudu Marote e DJ B8.
O clipe, dirigido por Premier King, tem roteiro inspirado no filme hollywoodiano Jumanji, mas em versão afro. Um misterioso jogo aparece na vida de um cidadão comum que anda descontente com as notícias da TV. A cada manipulação que faz no tabuleiro, o jogo faz aparecer Reis e Rainha africana(os) pela cidade. Esses personagens se reúnem e lhe dão um “afrochoque”, que faz com que ele perceba a força que tem.
Convido vocês para conferir agora mesmo um papo especial sobre tudo isso com o Monkey Jhayam.
Como foi o processo de composição do novo single “Afrochoque” ?
A ideia de “Afrochoque” surgiu logo na sequência do lançamento do single “Pulelê” com participação da cantora Gaby Amarantos. Eu já estava submerso na pesquisa sobre “Musicas das periferias do mundo todo”, no universo do Kuduru, do Afrobeat, em contato com alguns produtores de Luanda e Nigéria, buscando entender mais as similaridades com o Brasil, estudando e trazendo referências musicais para minha nova banda, que foi formada no final de 2018, na ideia de produzir novas versões as minhas músicas antigas para celebrar um show de 10 anos de carreira.
Quando DJ B8 me apresentou a ideia do instrumental era exatamente o ritmo que estava buscando fundir, após muito tempo de experimentações em estúdio, chegamos a “Fórmula do Afrochoque”. As Programações de bateria, ficaram por conta de Ubuntu, produtor baiano que com propriedade, trouxe esse swing único que se comunica de forma rítmica com as mesmas claves percussivas de muitos países do continente Africano. Victor Fão no trombone, Marco Stoppa no trompete, Bio Bonato no sax barítono e Beto Malfatti no sax alto e flauta transversal formam o time dos metais, Marcos Maurício nas teclas, Vinícius Sampaio na guitarra, Danilo Tael no contra baixo na cadência das congas de Luciano dos Santos. Todos sob a direção do mestrão DJ B8.
Lembro que quando estávamos juntos pensando em quem poderia mixar a faixa, chegamos rapidamente no consenso de convidar Dudu Marote, queríamos alguém que fizesse essa ponte do digital com o orgânico, a fim de construir uma linguagem “GLOCAL” desbravando toda essa pangeia musical. O processo com Dudu Marote no La Cocina durou por volta de 12 meses, foi um processo intenso de trabalho onde pudemos chegar realmente na essência, na alma, na sonoridade que queríamos. Paralelo a tudo isso, fui desenvolvendo a letra nos seus mínimos detalhes. Cada frase ali contida, abre uma leva de interpretações, mas todas são focadas em um só objetivo, o conhecimento, o empoderamento, a auto estima para toda diáspora africana espalhada por todo Planeta Terra.
Nesse momento tão importante você traz o empoderamento das comunidades negras. Queria que você falasse mais sobre a importância dessa consciência e mais ainda colocá-la em uma música. Você acha que atualmente no cenário que vivemos tem essa consciência dentro das composições? Por que é tão importante falar sobre?
É importantíssimo que nosso povo tenha acesso a uma educação que não seja essa educação colonial que nos impede de viver em harmonia com nossas diferenças, essa que nos é imposta desde a interrupção da “história Preta”. Eu vejo a escravidão como uma interrupção da nossa história, nosso reinado. Essas pessoas precisam saber quem elas realmente são, se conectar novamente com seus costumes e hábitos, com seus ancestrais, com suas forças para além dessa realidade na qual foram inseridas. Por isso essa ideia de criar novas expectativas de futuro onde o preto tem poder, de ser, de estar, de fazer ou ser o que quiser, se faz necessário em músicas, em filmes, materiais educacionais escolares, em livros didáticos e em todas as áreas e segmentos, para que possamos formar seres humanos conscientes e profissionais para poder se levantar em cada uma dessas áreas, nos unificamos e contar nossa própria história por nós mesmos, na nossa própria ótica, de acordo com a nossa própria realidade.
O clipe foi inspirado no filme “Jumanji”. Como foi o processo de criação para o clipe?
É o oitavo clipe que tenho a honra de trabalhar com Cayo Quintanilha aka Premier King. Eu confio muito na direção artística que ele faz. Fomos criando o roteiro em parceria eu, o Cayo e o Ruffah, já tinha na minha mente a ideia de convidar o Roberto Marcondes aka Robertrix pra ser o personagem principal.
No tempo que morei em Araraquara, interior de São Paulo, fiquei fascinado com a forma que ele se transformava e fazia seus números de pirofagia inspirado em danças da tribo Zulu. Ele representava em si, o Afrochoque. Em cima disso fomos desenvolvendo essa ideia já baseada nesse contexto do Afrofuturismo, os nomes dos personagens surgiram naturalmente no desenvolvimento, todos eles se conectam a vivências da minha infância. Roberto Marcondes interpreta “Buiu” (antes do Afrochoque), e Robertrix, ele mesmo, o personagem da vida real (após o Afrochoque), Marcos Vieira, meu querido pai, interpreta “Seu Ticão”, dono do estabelecimento que troca coisas usadas, Thiago Moyses aka DJ B8 é o sócio do Seu Ticão; Pedrinho, meu primo, interpreta o garoto que tenta trocar a peça no fim do filme.
“Buiu” está meio entediado com as notícias da televisão, resolve dar um fim, vai até o comércio do “Seu Ticão” que oferece um jogo como troca, “Buiu” não aceita e deixa a televisão ali mesmo por nada. Quando volta pra casa, misteriosamente o jogo aparece em sua sala, ai começa despertar a curiosidade que o faz tentar entender como se joga. Cada movimento com as peças, liberta reis e rainhas Africanos pela cidade. Ele corre para devolver o jogo sem entender o que está acontecendo, quando se depara novamente com os reis libertados pelo jogo, eles se unem e dão o Afrochoque transformando o “Buiu” no “Robertrix”, que é quem ele realmente é a na essência, fazendo sua performance de pirofagia cuspindo fogo queimando toda a maldade.
O bloco A do figurino foi desenvolvido por Lucas Fidelis e João Moxca, o bloco B foi desenvolvido por Nicole Simon, as pinturas e maquiagens foram feitas por Dri Chezepan e Maya Rove, o Cabelo foi montado pela Queen Hair. O Carlos Eduardo aka Afreekadu foi o 1º Rei a aparecer, Barbara Terra foi a Rainha e Fabio Kabral foi o 2º Rei. O clipe todo foi filmado em um dia em duas locações. Todo editado e finalizado por Premier King. E cá entre nós, a história tem continuidade…
Quais artistas você acredita que traz essa consciência da comunidade negras em suas canções e que você indicaria para ouvirmos?
Eu fiquei hipnotizado quando comecei a pesquisar a fundo os álbuns mais antigos do Olodum, aquelas capas me despertaram a atenção para algo novo, mas ao mesmo tempo já presente no meu interior. Quando surgiu a oportunidade de gravar junto com Terra Treme, Bruno Zaia e o próprio Olodum uma versão do clássico “Quartezala” foi uma honra enorme e a confirmação de que eu estava no caminho certo. Lazzo Matumbi é outro gigante, assisti um show dele ano passado no Sesc Pompéia e chorei de alegria de poder estar vivendo aquele momento.
Também gostei muito do último álbum do Rincon Sapiência, Mundo Manicongo, meus manos do Afrocidade de Camaçari no qual eu sou fã e tenho escutado muito – inclusive salve AFROCITY – e não poderia deixar de citar o The Last Poets na qual tive a oportunidade de me conectar em Londres em 2017 através do produtor Prince Fatty. Escutem com carinho.
Entrevista chegando ao fim. O que podemos esperar até o final do ano?
Agradeço pelo espaço desde já. Com o lançamento de “Afrochoque”, retomamos agora em setembro o lançamento das músicas inéditas, será um lançamento por mês, estamos exatamente agora, trabalhando nos clipes de todas elas para que esse material chegue até todos vocês com a melhor qualidade possível. Também tive a oportunidade de registrar minha apresentação ao vivo com banda no programa Show Livre, corram lá pra assistir pra entender um pouco do meu trabalho, nessa situação de pandemia, ainda não se tem uma previsão de shows, eventos e festivais, mas continuamos produzindo “música para aumentar a sua imunidade” acreditando que logo logo estaremos juntos novamente celebrando nossa vitória sobre esses tempos difíceis.
Qual recado que você deixa para as pessoas que te acompanham e admiram seu trabalho?
Obrigado a todos. Meu coração está todo nesse diálogo que trocamos através das ondas sonoras, com alguns até diariamente. Estou dando o melhor de mim pra vocês, e espero que isso fortaleça e os levem coragem para se tornar o que são realmente, sem medo de ser feliz, que é pra isso que viemos ao mundo. Escutem minha música no Spotify, Deezer, Apple Music e Tidal, se inscreva no Youtube e deixe seu coraçãozinho pra receber as atualizações. Continuem se cuidando, usem máscara, seguem os protocolos de segurança e não se esqueçam que é ano de eleição. Pensa bem em quem você vai votar! Beijo