Conteúdo escrito com a colaboração de Gabriel Marinho.
“Somos uma banda de Punk Rock de protesto, somos apartidários defendemos a autogestão, não compactuamos com qualquer tipo de fascismo, lutamos por uma cena longe de preconceitos, nosso som NÃO foi feito para aqueles que defendem a exclusão das minorias, simpatizantes do militarismo e apoiadores desse governo lixo”.
A banda Os Maltrapilhos é um dos maiores mitos do Punk Rock brasileiro. É das poucas cuja aura underground não foi abandonada com o passar do tempo: eles mantêm vivo em seu espírito aquela originalidade musical que se fazia presente nos primórdios do movimento Punk, marcada pelo posicionamento crítico, pelo D.I.Y, pela humildade, pela composição instrumental rápida, e por uma essência notavelmente contestadora e ousada.
Desde o seu surgimento, a banda já dividiu o palco com grandes nomes do Punk Rock nacional e internacional, como Garotos Podres, Cólera, Olho Seco e Rattus (da Finlândia). Além disso, já realizaram shows em outros países e tocaram, inclusive, no Festival Internacional Punk/Hardcore, em Medellin. Sem sombra de dúvida, a banda merece o respeito e reconhecimento na cena do Rock nacional.
A primeira musica deles que eu escutei foi o clássico “Punk Rock Nacional”. Confesso que nesse primeiro contato, ouvi essa música umas dez vezes seguidas. Ela é potente, especialmente por sua letra ácida, que consiste num verdadeiro hino em louvor da cena underground, da liberdade de pensamento, e das mentes inquietas que estão à margem da indústria mainstream – tal como a própria banda está. As outras letras são bastante voltadas para problemas de cunho social, político e também abordam, a meu ver, temas como a crise existencial do homem moderno e a alienação.
Se você gosta do estilo original do Punk Rock, aquele provindo diretamente dos subúrbios calorosos de Londres de Nova Iorque, definitivamente deve mergulhar no som desse mito que sacode palcos e cabeças de todo o país. Batemos um papo com Os Maltrapilhos, e logo abaixo você confere essa conversa.
Como vocês definem o significado do “Punk Rock”?
O Punk Rock é um estilo de vida, baseado no “faça você mesmo”, onde não existem regras pré-estabelecidas, onde cada indivíduo se desenvolve dentro da cultura Punk da forma que melhor lhe convém, mas com coerência, é claro.
É comum lermos a icônica frase “Punk Is Not Dead”. Vocês concordam com isso? O Punk ainda está vivo?
Sim, o Punk ainda está vivo, porém, está diferente de quando surgiu, até porque o próprio mundo mudou muito, então é necessário que tenhamos que nos adaptar a várias situações. O Punk já não é mais aquela figura agressiva e totalmente antissocial como era no início. Aquele Punk de protesto de rua, de envolvimento em coletivos… hoje está cada vez mais longe disso.
Até agora, qual foi o momento mais marcante da carreira da banda?
Sem dúvida foi quando saímos do país pela primeira vez para participar de um festival. Além do crescimento musical, a interação com culturas diferentes faz com que você cresça como ser humano.
Vocês acham que há mais facilidade ou dificuldade para as bandas da cena underground atual conseguirem um espaço no mundo moderno?
Hoje é bem mais fácil ter uma banda. Devido ao advento da internet, você tem a possibilidade de divulgar seu som para praticamente qualquer país do mundo, além de ter acesso a diversas plataformas musicais para divulgar e conhecer novas bandas. O acesso a instrumentos importados, a maioria dos equipamentos para shows também evoluiu, e isso contribuiu para gravações e apresentações de maior qualidade.
Se pudessem dividir o palco com qualquer banda e/ou músico que admiram, quem escolheriam?
Difícil, viu? Apesar de já termos tocado com vários ícones… Mas dividir o palco com o ASTA KASK seria sensacional!!
Como vocês veem o atual cenário da música underground brasileira? Consideram que seja ativo ou inativo? Conhecem algumas bandas da cena? Quais?
A cena underground permanece ativa. O problema hoje é que são bandas em excesso, diversas ramificações que acabam segregando a cena. Alguns integrantes de bandas pensam que o underground é uma competição, o que na verdade é um pensamento completamente oposto aos fatos, pois a intenção do underground é justamente o contrário disso: trata-se de todos ajudando todos. Já conhecemos diversas bandas ao longo desses 25 anos de palco, de diversas cidades e estilos. Temos respeito pela grande maioria, então seria injusto citar nomes.
O D.I.Y faz parte do cotidiano da vida de vocês? De que maneira?
Sim, indubitavelmente. Organizamos shows beneficentes para ajudar creches, não temos gravadora ou selos para lançar nossos materiais, e eles são bancados por nós mesmos. O discurso deve ser coerente com a prática, caso contrário não faria sentido tocar Punk Rock.
Percebo que a letra da música “Punk Rock Nacional” retrata uma realidade que ainda se faz muito presente em nosso país. Há um trecho em que vocês dizem “essa cena ainda vai mudar”. Ela mudou desde que a canção foi escrita e produzida? Sim? Não? Como foi essa mudança?
Mudou e muito. A letra prega uma união que virou utopia, infelizmente muitos estão na cena apenas para se auto-promoverem ou atingir um certo “status”. Nos dias atuais não escreveríamos uma letra assim, mas na época éramos jovens e acreditávamos que o underground poderia ser coeso e sem rivalidade, porém, a realidade mostra que a situação não é bem assim. As coisas acabaram mudando para pior. É claro que existem inúmeras de bandas comprometidas com o verdadeiro espírito da coisa, mas infelizmente muitas foram ficando pelo caminho ou desistindo. Porém, nós continuamos nossa trajetória junto com aqueles que realmente querem fazer a diferença na cena de sua cidade.
Qual é o posicionamento de vocês diante de um atual cenário político tão conturbado?
Somos uma banda de Punk Rock de protesto, somos apartidários defendemos a autogestão, não compactuamos com qualquer tipo de fascismo, lutamos por uma cena longe de preconceitos, nosso som NÃO foi feito para aqueles que defendem a exclusão das minorias, simpatizantes do militarismo e apoiadores desse governo lixo.
Quais são os planos da banda para 2019?
Nosso objetivo esse ano é gravar um novo material, que será o 4º da banda, além de continuar apoiando a cena através de nossa música e torcendo para que a grande maioria dos que nos ouvem assimilem as ideias de forma sensata e coerente.
Após a entrevista, a banda ainda me enviou um agradecimento especial. “Juliana, nós agradecemos por esta oportunidade de mostrar e manifestar nossas ideias, trabalho como de vocês consegue ter uma maior abrangência ao grande público, chegando aonde infelizmente nossa música não chega. Obrigado pelo apoio e pela bela iniciativa”.
Abaixo, você ouve o álbum Vivendo de Absurdos, lançado pela banda em 2013: