Imagina ter 87 anos e sair em turnê pelo mundo fazendo shows, cantando para casas lotadas? Pois é isso o que a maravilhosa Omara Portuondo está fazendo. Ela não consegue nem andar muito sozinha e precisa de ajuda para entrar no palco, mas impressiona com sua voz ainda linda e a interpretação cheia de sentimento, além do entusiasmo e alegria genuínos por estar ali, fazendo arte e música, a vida inteira dedicando-se a esta paixão.
Omara é cubana e integra a Orquestra Buena Vista Social Club, que está em uma turnê de despedida chamada “Adiós” desde 2014 (sim, eu sei! Parece até o Ozzy enrolando para se despedir dos palcos). Eles estiveram no Brasil de 10 a 15 de maio, passando por São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis e Porto Alegre. A cantora veio acompanhada dos integrantes originais Barbarito Torres (67 anos, alaudista) e Eliades Ochoa (71 anos, guitarrista). O trompetista Manuel Guaíro Mirabal, de 85 anos, não pode vir ao Brasil por motivos de saúde.
O show foi muito emocionante e uma verdadeira aula de música. O grupo é acompanhado por músicos mais jovens e igualmente talentosos e relembra clássicos da cultura cubana e da música latina, como rumba, cha cha cha e bolero. Vi a apresentação no Tom Brasil, em São Paulo. A casa estava lotada e misturava gente de todas as idades na plateia. O público reverenciava os músicos, cantava junto e, apesar da distribuição careta em mesinhas apertadas e não tão confortáveis (fiquei me perguntando a todo momento por que não colocaram o espetáculo em um teatro de verdade), no final não aguentou e caiu na dança, como deve ser. Também não entendi o horário da apresentação: estava marcada para começar às 22h e ainda atrasou um pouquinho. Bem tarde para uma banda formada por idosos, não é?
Mas, além de impressionar o quanto eles ainda conseguem tocar bem apesar da idade, o mais legal é a história do grupo. Nos anos 1990, eles já eram veteranos e alguns até estavam no ostracismo quando o guitarrista americano Ry Cooder teve a ideia de juntar as pratas da casa da música cubana para formar um super grupo. O nome veio de uma casa de shows dos anos 40 que unia música e dança e onde os grandes talentos se encontravam para tocar. Entre os integrantes originais já falecidos do Buena Vista Social Club tem o grande cantor Ibrahim Ferrer, o pianista Rubén González e o baixista Cachaíto (Orlando López). O projeto redeu um disco antológico e seminal, homônimo, lançado em 1997. Audição obrigatória!
O disco ganhou um Grammy e fez tanto sucesso nesse revival dos clássicos da música cubana que virou um documentário dirigido por Win Wenders em 1999. O filme também estourou, foi indicado ao Oscar e ganhou um European Film Awards como “Melhor Documentário”. Vale a pena assistir.
E, apesar da turnê ser uma despedida, o pessoal não quer saber de parar, não! Principalmente Omara. Ela foi a última a sair do holofote no Tom Brasil, praticamente arrastada por um assistente. Depois do bis e de toda a banda ter ido embora, continuou firme no palco, de pé, sozinha, cantando à capela e puxando palmas da plateia. Em outubro, ela vai fazer um show com a Vanessa da Mata na mesma casa de shows. Que disposição! Isso que é amor à música.
Fotos e vídeo: Rodolfo Yuzo
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