Sábado, nove de dezembro. Começava ali a minha última jornada de shows em um ano que me rendeu boas surpresas como o John Mayer, uma saga pelo Lollapalooza Brasil e, claro, o fim da longa espera pelo The Who.
A pauta da vez era com os canadenses do Arcade Fire e a sua Infinite Content, turnê que promove o mais recente álbum da banda, Everything Now, lançado em julho. Com diversos problemas ao longo do processo de venda e as mudanças na formatação do show – que teve o seu palco posicionado em frente a um dos setores de arquibancada do sambódromo no Anhembi, o público de cerca de dez mil pessoas que compareceram ao evento acabaram recompensadas com boas apresentações.
A noite começou com os colombianos do Bomba Estéreo e a sua mistura sempre contagiante de electro, cumbia e a animação de Li Saumet nos vocais. Ao longo de quarenta minutos, o grupo comandado por Simón Mejía mostrou algumas faixas da carreira, contemplando mais os trabalhos anteriores como o Amanecer ao invés do Ayo, álbum que saiu esse ano.
O grupo, que passou pelo Rock In Rio em setembro, deixou mais uma boa impressão nos brasileiros e já merece uma visita como manda o figurino. A energia em torno de “Caribbean Power”, “Qué Bonito” e “Fiesta” deixou um claro gostinho de quero mais em quem chegou cedo para garantir um bom lugar para ver a atração principal da noite.
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Com uma apresentação inspirada nas tradicionais disputas de boxe, era hora da luta principal da noite: o Arcade Fire voltava a São Paulo e, pela primeira vez em formato solo, estava pronto para defender o seu cinturão de banda indie amada por todos no Anhembi.
A grande dúvida era saber como seria essa luta com as músicas de Everything Now. O álbum dividiu opiniões mundo afora e, devido a isso, a curiosidade estava no ar: será que elas conseguiriam envolver o público e criar momentos tão especiais como “We Exist” ou “Wake Up”?
A resposta a pergunta começou a ser dada logo de cara com a faixa que dá nome ao disco. “Everything Now” e o seu claro pop oitentista mostrou ser uma das novas músicas capazes de empolgar. Sem pausa, a banda não deixou o público respirar e já mandou “Rebellion (Lies)”, uma das boas músicas do Funeral (2004) e “Here Comes the Night Time”, faixa do Reflektor (2013).
Assim como “Everything Now”, outra das músicas do novo trabalho que funcionou ao vivo foi “Creature Comfort”. Apesar disso, o percurso mostrou que o álbum não consegue prender tanto o público e, por ser responsável por um terço do setlist – só não tocaram “Signs Of Life”, “Infinite Content” e “Good God Damn”, o público acaba perdendo o foco em alguns momentos.
Como era de se esperar, os pontos de alta estão mesmo nos trabalhos anteriores. E são nesses momentos em que a plateia corresponde e nos mostra a força do Arcade Fire junto a eles. Seja nas faixas aceleradas ou nos momentos mais introspectivos, a conexão entre banda e público ficava claro, sendo difícil não se contagiar com “Ready To Start”, dançar ao som de “Reflektor” ou se emocionar com “Neighborhood #1 (Tunnels)”.
O carinho especial pelo Brasil podia ser visto de várias formas. Em determinado momento, Win Butler exaltou a energia do público brasileiro. “Sempre que tocamos no Brasil ganhamos energia para três anos”. E ainda teve tempo para lembrar que São Paulo era a sua cidade favorita no mundo ou pegar uma bandeira do País logo no começo do show. Pensa que acabou? A banda entrou e saiu do palco pelo meio do público e ainda levou consigo a bateria da Acadêmicos do Tatuapé, que participou de “Here Comes The Night Time” e “Haïti” logo no começo do show e voltou no bis, transformando o fim de “Wake Up” em um grande bloco carnavalesco.
No entanto, existe um show a parte no Arcade Fire: Régine Chassagne. Além dos vocais e de toda dança contemporânea quando assume o posto de protagonista, a instrumentista ainda mostra toda a sua capacidade ao transitar pelo palco tocando bateria, piano, xilofone, teclado, keytar e acordeon.
Ainda que a Infinite Content tenha encarado diversos problemas antes de desembarcar, o saldo ao final do show em São Paulo é positivo, pelo menos para o público que bateu ponto no Anhembi e também para a banda, que se despediu com Butler agradecendo as dez mil pessoas que lá estiveram. “A gente sabe que é muito caro vir pro show e a gente agradece muito a todos vocês por terem vindo”.
Talvez tenha faltado alguma música ou as duas horas não tenham sido suficientes para saciar a vontade dos fãs mas, se a gente estivesse acompanhando uma apuração neste momento, a Unidos do Arcade Fire receberia dez na maioria dos quesitos. Ou manteria o seu cinturão colocado em disputa no início da noite. E isso porque eu nem citei que o grupo doará um dólar de cada ingresso vendido para uma ONG de São Paulo, hein?