O RPM aproveitou seu auge na década de 1980. Depois disso viveu várias fases entre idas e vindas, além de uma carreira solo do vocalista/baixista Paulo Ricardo. Um dos grandes trunfos da banda era conter influências de qualidade, como The Police e projetos de rock experimental, o que foi muito bem casado com as pegadas tradicionais do rock brasileiro na época em que Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Titãs e Barão Vermelho eram os principais representantes da nossa música. O RPM podia não ter a mesma qualidade, mas certamente aproveitou-se do fato de ter um galã como frontman. Do contrário, Paulo Ricardo não se aventuraria por tanto tempo sozinho. E semana passada, eles estiveram em Belo Horizonte para apresentar o novo show que coroa essa fase atual do RPM.
Eu tinha essa necessidade pessoal de ver o RPM ao vivo, já que o LP de Radio Pirata marcou uma época importante na minha formação musical. Possivelmente, muitos que estavam no Chevrolet Hall estavam vivendo a mesma sensação de nostalgia, de poder resgatar um tempo meio brega em que as faixas da banda de alguma foram funcionaram como trilha sonora.
Paulo Ricardo e companhia demoraram bastante para subir ao palco. Enquanto isso, bastava olhar ao redor para confirmar que a casa não estava lotada e que havia uma mistura curiosa de jovens e adultos (a maioria, claro). Uma família em especial me chamou a atenção. Depois do show fui até eles e descobri que era uma coisa de transmitir para os filhos uma experiência do passado. Os pais afirmaram que a sensação foi tão boa quanto na época em que o RPM estava no auge. Também pude observar um repórter de um canal universitário entrevistando apenas garotas bonitas que estavam na pista. Até aí, ok, compreensível, mas chamou a atenção a abordagem. Me deu até curiosidade para assistir ao resultado final, confesso.
O RPM subiu ao palco com toda aquela pose e atitude típicas de quem tem confiança no próprio trabalho, mas que no caso deles não deixou de transmitir uma estranha impressão de arrogância. Talvez o ventilador no rosto do vocalista para fazer seus cabelos se moverem (no melhor estilo Bon Jovi e Axl Rose – ou seja, puro anos 80) tenha contribuído com isso mais que o visual do vocalista.
Na segunda música, “Rainha”, lançada no retorno da banda no começo dos anos 2000, foi confirmada a previsão de um show calcado no passado e com uma pegada meio brega, glam, não sei ao certo descrever. Ao mesmo tempo que a letra diz “lábios cor de vinho tinto”, o telão exibe uma imagem vulgar de uma língua acariciando a parte superior do lábio. Mais expositivo e óbvio impossível. No entanto, é preciso parabenizar a equipe responsável pelos efeitos visuais do show como no momento em que criam um “túnel verde” no meio do palco na cover de “Flores Astrais”, do Secos e Molhados. A impressão de movimentação é incrível e casou bem com a ideia de uma banda de rock no palco.
A sequência com “Vida Real” apresentou uma versão diferente da trilha sonora do BBB. Com tantas roupagens diferentes para uma faixa medíocre, imagino que isso tenha influenciado a decisão de mexer com a linda “A Cruz e a Espada”, que ganhou um arranjo mais pesado que arruinou a beleza da canção composta por Luiz Schiavon e Paulo Ricardo, mas imortalizada na voz de Renato Russo. Não demorou para tocarem outra versão: “Exagerado”, de Cazuza. Os mineiros mostraram que estavam acordados e cantaram alto pela primeira vez. A sessão de covers continuou com uma homenagem ao Pink Floyd, John Lennon, Bob Marley e U2.
Paulo Ricardo insistia em falar muito antes de todas as músicas. Fazia questão de parecer simpático para apresentar cada faixa, o que rendeu um momento bem vergonhoso em “Olhar 43”, que ao lado de “Alvorada Voraz” e “Radio Pirata” marcaram a noite como os pontos altos do show.
O RPM encerrou a noite com uma apresentação razoável e que atendeu as expectativas do público fã da banda ou que estava ali simplesmente para se divertir. A trupe de Paulo Ricardo sabe bem como fazer suas músicas agradarem aos já iniciados, mas parece não se importar em conquistar os mais novos ou aqueles que foram para conhecer a banda. Uma prova disso é o timing horrível para lançar uma canção de protesto inspirada nas manifestações de junho. Quem quer ouvir isso esse ano? Ok, vocês podem dizer: “mas o Titãs lançou e todo mundo gostou”, e a resposta é óbvia: apesar de terem surgido na mesma geração, Titãs é Titãs, RPM é RPM…
.
Fotos: John Pereira.
Veja mais fotos do show do RPM em Belo Horizonte aqui.
.
Ps.: Agradeço aos leitores Mari Silva Nascimento e Tiago Mariz por uma correção feita ao artigo original.