José Macia. Pepe. Canhão da Vila.
Bi-campeão da copa do mundo pelo Brasil e bi-campeão mundial pelo Santos. Um dos melhores batedores de falta que já existiu e, segundo ele, o maior goleador humano da história do Santos “afinal o Pelé, é de outro planeta”.
Conversei sobre coisas terrestres, como música, histórias, infância e, obviamente futebol com um dos maiores jogadores de futebol da história. Aos 86 anos, Pepe me contou que durante sua trajetória, chegou a fazer show com Toquinho e que ainda continua ouvindo sua coleção de discos, principalmente os do rei, Roberto no caso.
Qual a relação que você enxerga entre música e futebol?
Normalmente, todo jogador de futebol gosta muito de música. Principalmente nos ônibus que vão para os estádios. A música impera pela batucada no ônibus. Quando íamos jogar partidas importantes, ela servia até pra um “relax”, naqueles trajetos de 20/30 minutos, você vai ali se distraindo e se divertindo na batucada. No meu tempo de Santos, tinha um pessoal que gostava muito dessa batucada. Íamos cantando o hino do santos e outras músicas, todo mundo cantando junto. Os cantores eram péssimos (risos), mas servia pra distrair a gente né? Então a música tem muita relação com o futebol, todo o jogador gosta muito de música.
Uma coisa que acontece bastante na música e na arte no geral é que acham que são tudo um bando de vagabundo que não trabalha. Foi assim também no começo de sua carreira como jogador? Você poderia contar um pouco mais sobre isso?
Ah, com certeza. Me levaram pra treinar no Santos quando eu tinha 16 anos e meu pai era um “espanholzão”, tinha uma mercearia, e na época diziam que jogador de futebol era malandro, que não trabalhava. Mas a profissão do jogador é isso, treina de manhã e de tarde, concentra, viaja. Isso não é fácil. Eu, não só como jogador, mas como técnico também, fiquei muitos dias, horas e até meses longe dos filhos, da esposa. Então não é fácil. É um sacrifício, às vezes muito bem remunerado, mas é um sacrifício. A gente sente falta dos nossos entes queridos. Trabalhei no Japão, no Peru e quando eu viajava eu não via a hora da minha família chegar. Já deixava tudo pronto pra que quando eles viessem a gente pudesse aproveitar juntos. Me dava muito mais força, não só como jogador mais como técnico.
Ah, com certeza, o apoio da família sempre faz muita diferença.
E Você toca algum instrumento? Qual a sua relação pessoal com música?
Eu não toco nada. Na época eu arrumava um pandeiro, nem se de onde, ou então uma panela, pegava lá no restaurante do hotel e fazia aquela batucada. Íamos nos distraindo. O Tite, que foi ponta esquerda do Santos antes de mim, ele era uns 5 anos mais velho que eu. Quando ele era titular, eu ainda jogava no juvenil. Ele cantava muito bem. Tanto que, quando parou de jogar, ficou um tempo como cantor profissional. Então ele era o cantor do nosso time né. A gente ia do hotel pro estádio e voltava cantando também. Principalmente quando ganhava, o que era comum (risos). E o Tite tinha uma voz maravilhosa, lançou vários discos e tal. Infelizmente ele ja faleceu, era um grande ponteiro e um cantor muito bom. Tipo assim do Nelsinho dos Santos, aquelas músicas amorosas e românticas.
Já eu não tocava nada! (risos) Só entrava no coro.
Vocês criavam músicas ali na hora?
O Pelé que fazia as composições dele e sempre terminavam iguais (risos) . As rimas eram todas com AR. Amar, lutar, jogar etc. Ele tinha aquele vozeirão grave, mas quando tava o Tite a gente só entrava nos intervalos das músicas (risos). Inclusive, quando a gente estava viajando, sempre chamavam ele pras rádios.
Quais são seus gostos pessoais em música? Que músicas você tem escutado atualmente?
Eu como brasileiro gosto muito de samba, mas atualmente não tenho assim um grande cantor, um grande ídolo. Gosto e tenho muitos discos aqui na minha casa. Eu gosto muito do Rei né, Roberto Carlos eu sou apaixonado. E se sabe que existe uma ligação bacana entre a gente, jogador de futebol, e os cantores né. Eles também tem seus ídolos e quando nos conhecem, a recíproca é verdadeira. Temos um contato muito bom.
Isso é muito lindo, né? Inclusive tem muita música inspirada em jogador. Como aquela “Saudades do Galinho”, do Moraes Moreira, composta para o Zico. Você tem alguma experiência deste tipo?
Ah sim, eu fiz um show junto com o Toquinho, acredita? Eu falando sobre futebol e ele cantando. Fizemos esse show juntos no SESC de Santos. A gente [jogadores do Santos], quando viajava, encontrava às vezes artistas brasileiros no exterior. O Agostinho do Santos, por exemplo, amava jogar bola. Então ele foi treinar com a gente uma vez. O Anselmo Duarte, talvez o maior galã que o brasil já teve, foi treinar com a gente também. Era um péssimo centroavante (risos). A gente deixava ele fazer gol no treinamento e ele ficava feliz a beça.
Então esse contato entre jogador e cantor, na nossa época, nos divertíamos. Conhecemos o Mario Moreno Cantinflas, maior comediante mexicano. O Santos tinha muito prestígio no exterior, todo mundo queria conhecer a gente (risos). Esses contatos eram maravilhosos.
Agora eu gostaria de fazer uma brincadeira: Qual jogador você acha que teria sido o melhor músico?
O jogador que seria o melhor músico? (risos) Sem dúvida o Tite mesmo, no ônibus e nas viagens ele era imprescindível. Ele cantava muito bem, ganhei alguns discos dele e tals. Ele era muito amigo de Agostinho dos Santos, Wilson Simonal. A gente conheceu essas feras todas por intermédio dele, era muito bom cantor. Jogava muito bem e cantava muito bem. Era conhecido como o Craque cantor.
E você, se fosse músico, que tipo de música você tocaria?
Eu não sou carnavalesco, gosto de música romântica. Sou do tempo de Elvis Presley. Quando eu tinha uns 20 anos, me comparavam com ele por causa do topete.
Era proposital o topete do Elvis?
Não, eu era só bonito mesmo (risos). Era um cara boa pinta, mas o tempo foi passando e acabei perdendo o topete.
Bom, muito obrigado. Fiquei muito feliz que você topou conversar e sou muito seu fã. Além de ser Santista, sempre gostei de bater falta e ficava assistindo vários vídeos de suas cobranças, do canhão da vila!
Fui muito divertido mesmo! Você sabe que uma vez eu encontrei um jogador aqui no interior de São Paulo, a gente já tinha se aposentado. Ai resolvi perguntar pra ele por que ele ficava de costas na barreira quando eu ia bater a falta, perguntei se era medo. Ele me disse que não, que ficava de costas pra conseguir ver o gol do canhão da vila!
Leia mais textos do Rafael Durão na coluna Turma do Amendoim.