Texto por Karen Rubim
Planejado para ocorrer no Allianz Parque e realocado para o Ginásio do Ibirapuera menos de um mês antes da data marcada, o show do Muse – com abertura do Kaiser Chiefs – aconteceu ontem à noite, numa casa estrategicamente montada para que ficasse lotada: o palco construído ocupava grande parte da quadra e metade das arquibancadas tiveram seu acesso bloqueado por falta de visão, de forma que os poucos ingressos vendidos para o estádio foram suficientes para preencher o novo espaço.
Um adendo antes de começar: sou fã do Muse desde 2004 e acredito que o material da banda vem caindo em qualidade desde o lançamento do The Resistance, de 2009. Jurei de pés juntos que não iria nesse show, pois achei o Simulation Theory um álbum bem medíocre. Eis que surgiu a oportunidade de ir como colaboradora do Audiograma. Fui.
A noite começou com o Kaiser Chiefs subindo ao palco pontualmente às 19h45. Num show de 45 minutos e 10 músicas, a banda fez o público se agitar com hits como “Every Day I Love You Less and Less”, “I Predict a Riot”, “Ruby”, “Never Miss a Beat” e “Oh My God”, que encerrou a apresentação.
Não sou grande fã, admito. Nas músicas que intercalaram as famosinhas, nada me chamou a atenção de verdade. Inclusive, a menina segurando dois copos de cerveja e esperando que as pessoas dessem licença pra ela passar e poder voltar ao seu lugar – coisa que ela só conseguiu fazer quando eu disse que ela teria que se espremer entre os coleguinhas -, fez com que eu perdesse uma ou duas músicas simplesmente por não percebê-las, tão morna foi à recepção do público a elas. O vocalista Ricky Wilson, entretanto, faz juz ao título de frontman: agitado, dança o tempo todo, lança o pedestal do microfone ao ar, pula pra todo lado e puxa o grito enlouquecido da plateia quando pergunta “vocês estão prontos para o Muse?”.
Às 20h30, inicia-se a espera angustiante pela banda principal ao som do que me pareceu ser a trilha de Stranger Things. As pessoas se apertam na pista, tentando diminuir o espaço entre elas e os integrantes que parecem não chegar nunca. Meia hora depois, uma versão alternativa de “Algorithm” começa a tocar, anunciando a entrada de Dom Howard, Chris Wolstenholme e Matt Bellamy, que surge de um buraco no chão na extensão do palco. Minha primeira surpresa, que se manteve ao longo do show todo: mesmo com a mudança de local para um espaço muito menor do que o original, a banda manteria a estrutura de show completa, com dançarinos e efeitos visuais, coisa que nunca tinha acontecido nas apresentações anteriores no Brasil.
“Pressure”, “Psycho” e “Uprising” são acompanhadas em uníssono pelo público. Em “Propaganda”, o Ginásio se enche rapidamente de gás de gelo seco, lançado pelas armas das dançarinas. “Plug in Baby” começa e o bom brasileiro começa a cantar o riff da guitarra ao mesmo tempo que Matt o toca. Um trecho de “Pray”, música em valiriano – língua inventada para Game of Thrones – é tocado e emendado com “The Dark Side”, a melhor música do Simulation Theory, de longe.
Em determinado momento, Matt anuncia que vão tocar uma música velha, de 20 anos atrás e tive a minha segunda surpresa: “Showbiz”, com o riff de “Ashamed” grudado no fim. Essa foi a hora em que a certeza que estava no fundo da minha mente se escancarou: a esmagadora maioria do público estava ali por conta dos dois últimos discos e parecia conhecer as outras músicas dos trabalhos anteriores, como “Hysteria” e “Time is Running Out”, simplesmente porque elas são tocadas em exaustão em todos os shows da banda. A recepção da preciosidade que é “Showbiz” foi extremamente morna. Imagino que tenha sido o momento de descanso para grande parte do público, assim como foi a versão acústica de “Dig Down”. Depois, vieram ainda “Madness” e “Mercy”, com a já esperada chuva de papel picado e serpentinas, músicas nas quais Matt larga a guitarra e vai passear pelo público dando a mão para as pessoas, incorporando uma vibe meio Bono do U2 da qual eu, já há alguns anos, só consigo sentir vergonha alheia.
A melhor parte do show é a final com o “metal medley”, uma grande mistura de músicas com bastante guitarra, que, na minha opinião, é sempre o melhor que o Muse tem a oferecer. Ao mesmo tempo que trechos de “Stockholm Syndrome”, “Assassin”, “Reapers”, “The Handler” e “New Born” se transformaram numa grande música de rock com duração de alguns minutos, o robô-gigante-inflável Murph estava no fundo do palco, balançando seus braços, após ter seu “nascimento” anunciado pelas imagens no telão ao longo do show inteiro. Então, Chris começa “Man with a Harmonica”, anunciando que o show chegará ao fim com “Knights of Cydonia”, que roubou os balões flutuantes que costumavam ser soltos em “Plug in Baby” – um final visualmente bem sem graça dado o que já tinha sido visto no resto da noite.
Essa foi a 12ª apresentação do Muse no Brasil e o meu décimo show: perdi a apresentação no Rio em 2015 (graças ao Damien Rice, que marcou show em SP na mesma data) e o Rock in Rio do último domingo. Apesar do show de ontem, em termos de setlist, ter sido um grande mais do mesmo intercalado com músicas ruins dos últimos dois álbuns, fiquei realmente impressionada com a qualidade técnica visual da apresentação como um todo. Pra quem viu pela primeira vez, com certeza entrou na lista de melhores shows.
No fim, acabou valendo a pena.