O som tropical e dançante de Camões está de volta com o seu novo álbum, Drink Club.
Caminhando para uma direção diferente de seu registro de estreia, Flôres (2018), o artista carioca construiu o novo trabalho a muitas mãos, reunindo amigos para noites musicais permeadas por explorações sonoras e etílicas. Com oito faixas, o registro conta com uma sinceridade ácida mergulhada em referências oitentistas e, ao mesmo tempo, modernas.
Após os EPs Cupim e Anilina, além de seu disco de estreia, Camões quis expor seu lado mais solar e agregador. Por isso, mais da metade das faixas de Drink Club contam com convidados e amigos do cantor. Esses encontros acabaram gerando uma série documental, intitulada Aperitivo. Lançada no IGTV e posteriormente no YouTube, a série mostra todo o processo criativo e de produção do álbum.
Entre os convidados, nomes como Bruna Croce, que abre o disco em “Pra ver o mar”; Luíza Boê, cantora capixaba que participa de “Baby bem”; Luluca, que traz uma vibe R&B em “Vc Nem Imagina”; e, por fim, Zé Ibarra, da banda Dônica, que escreveu junto de Camões a canção “Abraço Laranja”.
Enquanto as letras são permeadas por um lirismo sincero e rasgado, o lado musical do disco conta com a marca plural de um trabalho construído por muitos colaboradores. Além das vozes convidadas, colaboradores usuais do artista, como Antonio Dal Bó, Giordano Bruno Gasperin e Julio Santa Cecília, marcam presença ao longo das faixas.
Transitando entre o boogie, o city pop, o R&B, a bossa, o vaporwave e o dream pop, Camões constrói um som orgânico, calcado nas suas crônicas musicais sobre amores urbanos.
Abaixo, veja o Faixa-a-faixa do álbum, feito pelo Camões:
Pra Ver O Mar: Assim que nos conhecemos, eu e Bruna marcamos de levar um som. Houve uma afinidade estética de cara. Pra Ver O Mar foi uma dessas músicas que a canção (letra e melodia) fica pronta em 20 minutos. E essas são as melhores. A Bruna abriu um esboço de arranjo que tinha feito no Ableton Live e se queixou de que estava sem ideia pra melodia e letra. Por sorte eu fui o segundo ouvido eleito. Foi ouvir aquele violão quase bossa com um arranjo moderninho de synths e backing vocals viajantes pra vir um turbilhão de linhas melódicas na minha cabeça de referências como Marcos Valle, João Donato e Marisa Monte. Já a minha colaboração no arranjo foi o beat mais marcado com o bumbo, a caixa de 707 e a ideia de cantarmos a música juntos praticamente inteira. Queria dar aquela textura do encontro da voz feminina suave com a voz masculina grave, como em várias músicas dos Tribalistas com a Marisa Monte e o Arnaldo Antunes.
Baldeação: Baldeação é uma música que surgiu naquela levação de som pré ensaio. Meio Daft Punk, meio Luther Vandross, meio City Pop, só pra citar alguma das referências descaradas dessa track. Na época estava morando em SP, trabalhando 10 horas por dia e finalizando o Flôres ao mesmo tempo. Vinculava muito a pista de dança aos raros momentos de lazer que tinha na época. Quis fazer uma música pra enaltecer aquele frisson de entrar na pista de dança. Disfarcei com uma história de romance pra dar pano pra manga. Mas a verdadeira musa dessa história é a pista de dança. Importante destacar a produção do Julio Santa Cecília a.k.a. DJ Guaraná Jesus que sampleou os avisos do Metrô Rio e direcionou a gravação de incontáveis camadas de synths e drum machines.
Vc Nem Imagina: Vc Nem Imagina é uma brincadeira. Quis fazer uma canção despretensiosa que fala sobre aquele início de romance que tira o cara do sério. A paixonite aguda. Sobre o arranjo, pra continuar na brincadeira, peguei referências do Drum And Bass, House 90’s e City Pop. Quis dar uma cara meio Claudinho e Bochecha, meio videogame, meio banda Kaleidoscópio. Uma curiosidade bacana é que o timbre de teclado que é exatamente o mesmo do House clássico “Gypsy Woman”, do grupo Crystal Waters, e usei um sample do início de “Conquista”, do Claudinho e Bochecha. A Luluca, que faz os backings, é uma amiga de quase uma década. Seu som explora o R&B e o neo-soul sem tirar os pés da nossa terra e achei que seu timbre ideal pra dar o tchan que faltava no arranjo.
Baby Bem: Baby Bem é sobre quando existe uma reciprocidade num início de romance, mas um dos dois não sabe se deve se entregar. E no fundo, tudo bem, porque estar na companhia um do outro já é o suficiente. Essa também quis trazer uma pegada pista pra ela: uma batida mais Miami Bass, Hip Hop combinada com uma seção harmônica mais City Pop. Nos backing vocals e contra-cantos conto com a participação da capixaba Luíza Boê, que acaba de lançar o EP Terramar. Ela colaborou com várias ideias nos arranjos vocais que deixaram a música ainda mais refrescante.
Se Envolvendo: Se Envolvendo é puro romance. Aquele momento em que a pessoa decide se entregar e arriscar a vida a dois. No arranjo, buscamos a inspiração em outras músicas românticas como “I Can’t Take My Eyes Off Of You”, da Gloria Gaynor, e “Lovely Day”, do Bill Withers. Referências nacionais como Roberto Carlos e Guilherme Arantes são evidentes. No solo de trompete midi, buscamos referências de timbre em músicas do City Pop (sim, mais uma vez) e deixamos ele o mais cafona possível propositalmente. Se apaixonar é sempre cafona (e maravilhoso).
Abraço Laranja: Abraço Laranja surgiu por conta de uma foto: David Alan Harvey Love Games (dá google aí). Na época tinha uma ex namorada que iria ser fotografada por esse fotógrafo famoso da National Geographic e Magnum Photos. Quando fui acompanhar a sessão, ele me achou um perfil interessante e pediu que abraçasse ela pra uma foto. Foi um abraço intenso no pôr do sol do Arpoador. Tão intenso que virou música. Mas esse é só o tema. A canção fiz numa tarde com o Zé Ibarra que ficou responsável pelo violão e acordes, enquanto eu assumi papel, caneta e letras. Assim que tínhamos um rascunho da canção, Zé insistiu pra irmos pra escada. Acho que ele só entende como de fato fica uma música, quando a ouve com bastante reverb. o Zé pratica quase todo dia na escada do seu prédio. É um cara viciado em reverb. Sendo assim, a produção seguiu esse anseio por reverb e eu e Julio fizemos uma produção com com uma ambiência bastante espaçosa. É como se a música fosse tocada num shopping vazio no melhor estilo Vapor Wave.
Nuca: Nuca é um amor de carnaval. Um romance com prazo pra terminar. Ela morava fora e estava aqui só por duas semanas. Já o arranjo musical tem referências que vão da Bossa Nova ao Dream Pop. Bossa Nova quando reproduzo alguns acordes da progressão harmônica de “Corcovado”. Dream Pop quando fazemos esse arranjo etéreo e espaçado, mas cheio de groove como nas canção da banda canadense “Men I Trust”.
Ana (NoDISC Remix): Quando ouvi esse Remix pela primeira vez, senti que tinha tudo a ver com a estética que estava pensando pra o Drink Club: drum machine, pegada pista e synths agudinhos. Sendo assim, por mais que fosse uma música do Flôres, esse remix merecia fazer parte dessa nova fase mais City Pop, city lights, ultra refrescante do Camões. Por ser um arranjo super minimalista e mais obscuro fazia todo sentido ser a música que encerra o álbum. Uma menção ao meu lado mais introspectivo tão presente nos trabalhos anteriores.