Em uma noite de lua cheia marcada por fenômenos astronômicos e astrológicos que não aconteciam juntos há 150 anos – a super lua, a lua azul e a lua de sangue, fruto de um eclipse lunar total – ver a dupla Ibeyi no Cine Joia, em São Paulo, foi uma experiência no mínimo especial.
Para quem não conhece, as irmãs gêmeas não idênticas Lisa e Naomi têm apenas 22 anos, mas já tocaram no mundo inteiro, estão promovendo seu segundo álbum (“Ash”, lançado em setembro de 2017) e caíram nas graças de grandes divas como Adele e Beyoncé – participando inclusive do disco-conceito “Lemonade” – e em abril vão se apresentar no Coachella. Nada mal para quem lançou o disco de estréia em 2015, né?
O som do Ibeyi já tem uma pegada espiritual e religiosa. O nome do projeto, aliás, vem de “ibeji”, palavra em iorubá que significa “irmão gêmeo” e também dá nome a um orixá pareado. A religião e o dialeto iorubá chegaram a Cuba com escravos da região da Nigéria e do Benim – que também influenciaram o Candomblé no Brasil.
Lisa e Naomi nasceram em Paris, mas sempre visitam Cuba, onde moraram por alguns anos; e são filhas do importante percussionista cubano Miguel Angá Díaz, que tocou com o seminal Buena Vista Social Club e com o Orishas, entre muitos outros artistas. A mãe das meninas, a franco-venezuelana Maya Dagnino, também é cantora. Por isso, as músicas do Ybeyi são multi-culturais e misturam letras em Iorubá, Inglês e Espanhol. Elas também têm muitas referências à Santería, religião que mistura o catolicismo às tradições de matriz africana. Na parte sonora, as irmãs misturam elementos de pop, R&B, eletrônica, jazz, música cubana e africana. A percussão, claramente influenciada pelo pai, é forte em todo o trabalho das gêmeas; e os vocais em dupla criam harmonias e atmosferas lindas.
Tudo isso faz com que o show delas tenha um clima místico e transcendental. E ontem à noite não foi diferente. Durante toda a apresentação, cânticos em iorubá embalaram o público junto a mensagens de positividade, purificação e proteção e muitas referências a raízes familiares e homenagens a entes queridos que já se foram, como em “Mama Says”.
Naomi e Lisa estavam muito emocionadas e empolgadas, felizes por voltarem ao Brasil. Elas interagiram com a plateia durante todo o show, esbanjaram sorrisos e simpatia, riram, choraram, pularam, dançaram. Apresentaram o novo trabalho explicando de que falava cada música nova, desde uma ode à emancipação feminina e combate ao machismo em “No Man Is Big Enough for My Arms” a uma linda homenagem à sobrinha Valérie, que tem apenas 5 anos e é o xodó da família, em “Valé”. Mais pro final do show, “Deathless” causou uma catarse coletiva com uma mensagem de força e esperança. No meio da galera, aliás, vi algumas artistas maravilhosas curtindo o som, como Tássia Reis e LaBaq.
O show também contou com a participação especial do rapper brasileiro Emicida, que cantou com as irmãs uma música nova inédita (que provavelmente será lançada como single, pois não faz parte do “Ash”). O encerramento, já no bis, foi com o maior hit da dupla, “River”, contando com um belo coro da plateia. No final da canção, virou praticamente um “à capella”, pois restaram apenas as vozes das irmãs e do público em apoio, batendo palmas e os pés no chão. Foi de lavar a alma, mesmo. Você não via ninguém saindo do Cine Joia sem um sorriso no rosto. Total good vibes.
Hoje, as irmãs tocam no Rio de Janeiro, no Circo Voador. Em 2016, elas encerraram a turnê do seu primeiro disco, homônimo, neste mesmo local – e disseram em várias entrevistas que foi um de seus shows mais marcantes, com a plateia mais especial, acolhedora e participativa. Se puder, não perca a oportunidade de vê-las. Vale muito a pena!