Se comparássemos os currículos de quem vive à vida no anonimato, em suas profissões sem glamour, com o currículo de quem vive no mundo da música, fazer parte de uma boyband seria o mesmo que ser o estagiário em uma grande empresa. Sem menosprezar um estagiário, o papel dele poderia ser feito por qualquer jovem que inicia sua carreira. Por ser inexperiente, é importante que o estagiário observe as pessoas certas para se inspirar e imprimir sua marca nem que seja fazendo o básico.
Em 2010, 5 novatos apareceram no cenário musical. Criados em um reality show, o grupo tinha tudo para ser encarado como “estagiário” em um mundão pop. Faz tempo que algum empresário tem a ideia não tão original de juntar uns moleques de boa aparência para fazer um som, e para muitos deles, a história profissional termina em no máximo 5 anos com muita instabilidade.
O comportamento de cada membro desde a formação de um grupo que já começa com data de validade para o público em geral é algo muito importante. No caso deles, continuaram levando o grupo, mesmo com um desfalque, e deixaram a porta aberta para uma carreira até então estável e resolveram se arriscar profissionalmente (quem nunca?).
Harry Styles, sempre foi o nome mais forte do One Direction. O carisma inegável e uma boa voz para um garoto naquela época com 16 anos chamaram a atenção na audição do programa The X Factor (UK), mas existia o problema de “não ter experiência o suficiente” segundo Louis Walsh, jurado do programa. 7 anos depois, com shows esgotados em estádios, milhões de álbuns vendidos e experiência na área, Harry usa a pausa para projetos pessoais do grupo para a aplicação da vaga mais importante da carreira e provar que sabe ser mais do que um ex-integrante de boyband.
O álbum de estreia do inglês conta com 10 faixas, todas elas com participação do próprio na composição. Harry foi para a Jamaica onde desenvolveu toda a parte criativa do CD. A primeira faixa “Meet Me In The Hallway” é uma ótima primeira faixa, mas quando se olha que a próxima faixa é o primeiro single da carreira solo do cantor, ela pode ser ofuscada e até ignorada. “Sign of The Times” foi uma grata surpresa do primeiro semestre e de longe o mais pretensioso dos first singles dos colegas de banda. Se alguns vão atrás do dance hall, outros pra EDM e no manjado “estilo Ed Sheeran”, Harry resolveu arriscar numa balada-pop-psicodélica com mais de 5 minutos. David Bowie estaria orgulhoso.
Harry usa e abusa de suas influencias e nunca teve medo de mostrar isso (literalmente da cabeça aos pés, figurino incluso). Apesar do cabelo cortado durante a primeira era solo, o cantor continua com a tradição de estampas exóticas nas camisas – as vezes mais abertas do que o necessário exibindo uma coleção de tatuagem questionável – calças que você nunca usaria, e sapatos feitos por encomendas. Um desconstruidx da porr#.
Pela aparência, foi comparado com Mick Jagger, e se pensarmos um pouquinho, musicalmente falando, pode ser covardia tentar implantar tantas comparações e pressionar tanto um artista em seu primeiro álbum, mas “Kiwi”, “Only Angel” e “Woman” mostram que aquilo que tanto se esperava do cantor foi alcançado: Harry sabe e muito bem usar as influencias como algo a ser acrescentado ao que existe nele, e não como um único caminho que deve ser seguido religiosamente a cada trabalho que faz. Styles não fica preso apenas em referencias dos anos 70 e 80, mas pega elementos de bandas como Kodaline e Snow Patrol nas calminhas “Sweet Creature” e “From The Dinner Table”.
Harry já anunciou a sua turnê, e pelo que vimos de suas performances até agora, a guitarra e o violão finalmente passaram para as mãos dele em definitivo principalmente nas performances de “Ever Since New York” e “Two Ghosts”, a última sendo uma das mais comerciais do álbum, e frequentemente conectada a ex-namorada Taylor Swift.
“Carolina” é a faixa que mais se assemelha ao trabalho pop/rock que o One Direction apresentou (e veio aperfeiçoando) desde o quarto álbum FOUR, finalizando com Made In The AM. Com todos os trabalhos solos lançados até aqui, fica mais claro ainda que Harry era o nome mais forte dentro do grupo, e que o grupo seguia a sua identidade musical.
Em 7 anos, Harry Styles pacientemente juntou experiência, se inspirou em grandes nomes, e conseguiu mostrar sua identidade na hora certa. Entregou um trabalho coeso e diferente do que temos no cenário musical.
O estagiário já pode ser efetivado.
Harry Styles – Harry Styles
Lançamento: 12 de maio de 2017
Gravadora: Columbia Records
Gênero: Indie Rock
Produção: Jeff Bhasker, Alex Salibian, Tyler Johnson e Kid Harpoon
Faixas:
01. Meet Me In The Hallway
02. Sign Of The Times
03. Carolina
04. Two Ghosts
05. Sweet Creature
06. Only Angel
07. Kiwi
08. Ever Since New York
09. Woman
10. From The Dinner Table