É difícil não ouvir a voz de Tom Chaplin e não se lembrar de músicas como “Somewhere Only We Know”, “A Bad Dream” ou “Bedshaped”, coisas lançadas por ele em companhia de Tim Rice-Oxley, Richard Hughes e, mais recentemente, Jesse Quin através do Keane.
No entanto, a banda anunciou um hiato em 2013 e seus integrantes mergulharam em outros projetos ou em merecidas férias. Enquanto Rice-Oxley e Quin embarcaram no Mt. Desolation, Chaplin resolveu se dedicar a um álbum solo e foi aí que as coisas começaram a desandar. Convivendo com ansiedade e receio do resultado do trabalho, Tom viu o seu vício em drogas atingir níveis desesperadores e quase o levaram a sua morte em 2015, após uma “orgia de drogas prolongada”. O episódio acabou servindo como o fim de um ciclo danoso e um ponto de partida para o recomeço.
Muitas vezes, momentos tristes ou de desespero fazem aflorar o nosso lado produtivo ou são responsáveis por despertar a nossa inspiração. Os últimos anos não foram fáceis para Chaplin e tudo aquilo serviu de matéria-prima pra que novas músicas pudessem nascer e o novo álbum solo enfim deixasse de ser apenas um desejo.
Após passar um longo período de reabilitação, cuidando de suas relações familiares e, principalmente, aprendendo a lidar consigo mesmo, letras foram surgindo e acabaram levando Tom para o estúdio. Após passar o primeiro semestre de 2016 trabalhando de forma intensa em tudo o que foi escrito, coube a Chaplin mostrar em agosto a primeira faixa do que seria o seu primeiro álbum solo, “Hartened Heart”, escrita em conjunto com Max McElligott. Como bem diz a letra da música em um de seus trechos, ele sabia que seu coração ainda estava batendo depois de toda a experiência e transformou tudo aquilo em algo real.
Em outubro, Tom lançava oficialmente The Wave e, logo na abertura, o disco já nos dá uma real noção do que encontraremos ao longo de seus 42 minutos: Algo pesado, mas esperançoso. “Still Waiting” é daquelas músicas que poderiam ser do Keane e você consegue imaginar como seria o dedo de Tim Rice-Oxley ao longo de sua audição. No entanto, ouvir trechos como “How I wish I was not hurting everyone I know” serve para mostrar a real intenção do disco, que é contar uma história que é de Chaplin, vivida e encarada por ele ao lado de sua esposa e de sua filha. Pensar em todo o contexto acaba colocando The Wave em um outro patamar. Não é só “o cara do Keane lançando um disco solo”, é maior do que isso. É o cara do Keane contando a sua história triste e pesada, falando de seus medos emocionais e o que tudo isso pode causar em um ser que, aparentemente, não tinha motivos para isso, já que tem uma carreira de sucesso e um suporte familiar.
Produzido por Matt Hales (a quem nos acostumamos a chamar de Aqualung), The Wave é resultado da mistura entre os temas pessoais e pesados da vida de Tom com toda a sua experiência profissional adquirida com os mais de vinte anos de carreira no Keane. Musicalmente, é fácil perceber o quanto Tom entrega a sua banda ao longo dos anos, assim como é possível perceber todas as fases da banda ao longo das faixas. Um exemplo disso é ouvir “I Remember You” ou “The River” e perceber que ambas caberiam em um disco como o Perfect Symmetry, assim como “Worthless Words” tem a sua proximidade com o aclamado Under the Iron Sea. Ainda que a zona de conforto de Chaplin esteja presente em boa parte das músicas, The Wave é mais do que “algo que caberia no Keane”. Isso fica provado sobretudo na segunda metade do disco, aonde estão “Hold On To Our Love” e “Solid Gold”, que é uma das melhores faixas do trabalho. E ainda tem a faixa título, “The Wave”, com a sua base instrumental orquestrada com um piano que completam a voz de Chaplin de uma forma que, talvez, nunca tenha ocorrido até hoje com o britânico. Nem mesmo com a companhia de seus amigos de banda.
Alguns fazem do limão uma limonada, outros fazem da dor um disco e, como disse anteriormente, The Wave era algo que Tom Chaplin precisava lançar sozinho. É um disco que mostra toda a sua dor e desespero de uma forma honesta, deixando clara toda a sua vulnerabilidade. Junto a isso, é um disco esperançoso. Esperançoso para o Chaplin, que enfim enfrentou os seus medos de uma forma saudável; esperançoso para os fãs do Keane, que renovam as expectativas de um ponto final em seu hiato; e esperançoso para todos aqueles que precisam de um combustível sonoro para se inspirar, enfrentar os problemas da vida (independente do grau e intensidade deles) e seguir adiante, como este que vos escreve.
Tom Chaplin – The Wave
Lançamento: 14 de outubro de 2016
Gravadora: Island
Gênero: Pop/Britpop
Produção: Matt Hales
01. Still Waiting
02. Hardened Heart
03. The River
04. Worthless Words
05. I Remember You
06. Bring the Rain
07. Hold On to Our Love
08. Quicksand
09. Solid Gold
10. See It So Clear
11. The Wave