Algumas pessoas costumam apreciar o mês de fevereiro e tudo que ele representa, tipo o fim das férias e a época em que os bebês são fabricados como as gotas de cerveja que caem dos céus no carnaval. Creio que nunca apreciei o carnaval como parte dos brasileiros costuma fazer. É uma grande tijolada no saco assistir todas aquelas meninas pagando de loucas e depois dando a desculpa que “no carnaval é tudo liberado”. Gente mentirosa e hipócrita me dá preguiça. Sem falar no quanto as músicas são ruins e a quantidade de mamute pelado que fica se exibindo e querendo confusão.
Enquanto muitos se esbaldavam com bebidas, músicas ruins, putaria e possíveis encomendas da cegonha, fiquei curtindo o que havia de melhor para aproveitar do carnaval. Ironicamente, um ou outro item está incluso nesta lista (não se trata de encomendas, diga-se de passagem).
Para quem acompanhou a coluna do mês passado, sabe que eu estava ansioso para assistir ao show do Criolo no Circo Voador, no Rio. O cantor se apresentaria na noite do dia 4, uma noite depois de um show incrível do norte-americano Mayer Hawthorne (foto). Aliás, não posso deixar de comentar sobre a performance do jovem e simpático cantor, que fez um show animado e que divertiu até mesmo quem mal conhecia o seu trabalho.
A banda tinha coreografia para algumas canções e houve um momento em que Hawthorne começou a posar para fotografias, de uma forma completamente debochada, e pediu encarecidamente para as pessoas se preocuparem mais com o show do que com a droga da máquina ou do celular. Apaixonante. O efeito da apresentação me deixou tão entorpecido (embora eu possa dizer que o ar do Circo também tenha ajudado um pouco nessa questão) que esqueci de comprar meu ingresso para o show do Criolo.
Minha amiga Julia disse que não haveria problema algum e que a gente compraria tranquilamente no dia seguinte, mas bem, não foi bem assim. Depois de uma longa viagem da Lapa para Niterói, com direito a “Confortably Numb”, do Pink Floyd, e um grupo de amigos bêbados e totalmente desorientados (um deles deitou no meu colo, ligou a luz do celular e olhou encantado para a minha tatuagem do braço, começou a cantar músicas do grupo Revelação e conseguiu arrancar gargalhadas estridentes de todo mundo do ônibus. Coisas que só acontecem no Rio) fazendo piada com tudo, chegamos em casa e descobrimos que os ingressos estavam esgotados. Sim. Um show no Circo Voador com ingressos esgotados. Haviam mais de 3000 pessoas dentro do Circo naquela noite e eu só não vou dizer que as invejo completamente, pois não sei se gostaria de ter compartilhado o suor do local.
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O Cícero continuou fazendo a alegria das minhas manhãs cansativas entre a minha casa até o meu serviço, mas também passei a dividir a atenção do iPod com alguns livros, dentre eles uma segunda leitura do “clássico” Alta Fidelidade, de Nick Hornby. Além de ser uma obra que encaixaria perfeitamente como uma biografia da minha própria vida, o livro é recheado com belas dicas de canções espetaculares. Vale a pena assistir e ler.
Por conta da releitura, acabei ouvindo discos de Aretha Franklin, Al Green e Otis Redding, três grandes ícones da black music que eu nunca tinha dado o devido valor. Todo mundo conhece a Aretha Franklin, mas eu admito que nunca havia ouvido mais que cinco canções dela. Lamento isso quase o mesmo tanto que lamento meus últimos anos de vida.
Al Green foi uma feliz descoberta, “Tired of Being Alone” é o tipo de canção que teria mudado a minha vida se eu tivesse ouvido no momento certo. (Miles Davis certamente ganhou um concorrente na hora de usar a artilharia pesada.) Existem outras músicas safadas, como “Look What You Done For Me”, é o tipo de música tranquila e que faz o caminho do ônibus passar rapidamente e sem nos deixar perder o bom humor.
Já Otis Redding era um velho conhecido por conta de “(Sittin ‘On) The Dock of the Bay”, um velho clássico e que pode ter sido uma das primeiras músicas a usarem um solo de assobio, mas no ano passado ganhou destaque por sua música “Try a Little Tenderness” ter sido remixada por Kanye West e Jay-Z. Gosto do resultado das duas e estou mega curioso para ouvir uma terceira versão: Florence and the Machine irá incluir a música na gravação de seu disco acústico. Imperdível desde já.
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Depois de comprar os ingressos para o show do Bob Dylan (sério, BH?), foi inevitável deixar de ouvir “Like a Rolling Stone” ou “Things Have Changed” em um loop infinito. Teria feito isso mais vezes se não fosse o excelente trabalho de Leonard Cohen e o disco Old Ideas. O efeito da voz de Cohen é uma coisa difícil de descrever. Ele soa como um pastor da putaria, que se insinua e provoca os ouvintes para cair no mar de perdição e simplesmente se desligar na atmosfera envolvente do disco.
Pode ser um reflexo da minha idade, mas em tempos onde é cada vez mais difícil um artista novo conquistar a minha atenção por muito tempo, Cohen fez uma oração sonora que precisa ser ouvida todos os dias e sem a menor moderação, pois nunca é demais encontrar a paz com o velho senhor e poeta, que também lançou um livro. “Going Home”, faixa de abertura, é recheada por um belo coral feminino e um arranjo simples, mas que nos deixa babando. “I love to speak with Leonard / He`s a sportman and a shepherd / He`s a lazy bastard living in a suit”. E eu te pergunto, caro (a) leitor (a): como resistir ao charme safado do coroa? Fácil na minha lista de favoritos do ano. (Já).
Meu cartão de crédito (quase) respirou aliviado em fevereiro. Se não fosse pela companhia da Julia no feriado do carnaval, eu teria passado livre das compras compulsivas, mas (não sei como) conseguimos tempo para visitar o BH Shopping e aquele paraíso da perdição no quarto piso: a livraria Fnac. Juro que não tinha intenção de comprar mais que um livro sobre o cineasta Martin Scorsese e o DVD do filme (500) Dias Com Ela, mas aí a Julia me mostrou o disco El Camino, do Black Keys.
Promessa é dívida e eu tenho uma coisa de comprar alguns discos e tive um lapso. Não tem como se arrepender, para ser sincero. Dias depois fui participar da gravação do Podcast do Microfonia (vocês podem ouvir aqui, foi um programa sobre cantores que se aventuraram no cinema. O resultado ficou hilário) e conversei com a galera da banda mineira The Hells Kitchen Project. Fui seduzido com uma cópia do disco recém lançado e conversei com o baterista Leo Braca sobre o Black Keys. Ele me indicou o disco Brothers e bem, eu tenho uma nova banda preferida desde então.
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Fevereiro, mais do que o mês do fim das férias, ou do mês em que o ano começa de verdade, é mais conhecido como o mês da maior premiação do cinema. O Oscar 2012, como nos anos anteriores, foi um saco e completamente entediante. Claro que gostei de ver um filme mudo vencendo a categoria principal, mas como um cinéfilo que ainda não conseguiu ignorar os gostos e ideias do coração, fui frustrado por meus filmes favoritos terem sido completamente ignorados da cerimônia. A vida não é justa, mas pelo menos o George Clooney não levou o prêmio de Melhor Ator por Os Descendentes, que é um filme bem fraco.
Creio que o público das páginas laranjas vá se interessar bastante por uma produção chamada Drive, estrelada pelo galã da vez Ryan Gosling. A trilha sonora (que nem chegou a ser indicada) é incrível e tem a assinatura de ninguém menos que Cliff Martinez, ex-baterista da banda Red Hot Chili Peppers. Além do material que o musico criou, existem faixas marcantes que se transformaram parte do longa-metragem, criando uma relação em que um não viveria sem o outro. Por maior que seja meu amor por Trent Reznor (igualmente rejeitado pela Academia, mas que fez um esplendoroso trabalho para seu amigo David Fincher em Millennium – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres), se o Oscar não tivesse parado nas mãos do gênio responsável por O Artista, ele deveria ter sido entregue para Martinez.
Mas prefiro não misturar música com cinema por algum tempo, pois desde que comentei publicamente no Podcast do Cinema em Cena sobre eu preferir Molejo aos Beatles, passei a receber ameaças demais e precisarei sumir até a ira dos beatlemaníacos cessar (ou alguém ensina-los o que é ironia).
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Espero que tenham tido um mês musical inspirado, pois ainda acho que estou engatinhando na hora de selecionar o material que irei escutar e comentar aqui. Claro que tenho a desculpa e posso afirmar que 2012 só começa agora, mas ainda assim é muito pouco.
A expectativa para o show do Foo Fighters começou a ficar insuportável, com direito a arrepios só de imaginar a apresentação, insônia, tremedeiras e crises de mau humor. Espero que consiga lidar melhor com isso até o dia 7 de abril, mas até lá, quero que meus fieis leitores cuidem dos seus ouvidos e que me visitem novamente no mês que vem.
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Discos Comprados:
Showbiz @Muse (presente)
Origin of Symmetry @Muse (presente)
El Camino @Black Keys
A Hell of a Day @The Hells Kitchen Project (presente)
Discos Ouvidos:
Showbiz @Muse
Origin of Symmetry @Muse
El Camino @Black Keys
Brothers @Black Keys
A Hell of a Day @The Hells Kitchen Project
Old Ideas @Leonard Cohen
Whatever`s On Your Mind @Gomez
The Colour and The Shape @Foo Fighters
Wasting Light @Foo Fighters
The Very Best of Al Green @Al Green
The Very Best of Aretha Franklin @Aretha Franklin
Suck it and see @Arctic Monkeys
Sea Change @Beck
Lira @Lira
How do You Do @Mayer Hawthorne
The Very Best of Otis Redding @Otis Redding
The Very Best of Rolling Stones @Rolling Stones
Shapeshifting @Young Galaxy
O Pensamento é Um Imã @Vivendo do Ócio