Uma longa espera. Acredito que de dez textos sobre a primeira visita do The Who ao Brasil, onze tenham começado dessa forma. Em tempos nos quais vemos artista que nem tem disco lançado marcando shows por aqui, aguardar mais de cinquenta anos por um show realmente impressiona.
Por mais que tivessem exceções, o público estava ali por todo o legado que Roger Daltrey e Pete Townshend representam para a história do rock e isso acabou ofuscando um pouco que teve a missão de ocupar o palco antes do The Who.
Em um São Paulo Trip bem cheio – mas não lotado, a primeira noite do festival começou com o Alter Bridge, que também visita o Brasil pela primeira vez. Mais de dez anos se passaram entre o primeiro show que vi do quarteto para o que chegou ao Brasil nesta semana e é impossível não notar o crescimento musical de Myles Kennedy, Mark Tremonti, Brian Marshall e Scott Phillips.
Com um setlist curto – apenas onze músicas, a banda passeou pelos álbuns da carreira, com destaque para o mais recente deles, The Last Hero, lançado no ano passado. Além das faixas do disco, músicas como “Waters Rising”, “Open Your Eyes” e “Metalingus” mostraram um pouco do que colocou a banda entre os destaques nos festivais europeus nos últimos anos. O encerramento ficou por conta da conhecida “Rise Today”, talvez a única que teve grande participação do público que já ocupava o Allianz Parque.
Com o The Cult subindo ao palco por volta das 19:45, era hora de ver o que a banda capitaneada pelo vocalista Ian Astbury seria capaz de fazer enquanto a contagem regressiva pelo show da noite continuava. A banda nunca foi uma das minhas preferidas, mas se eu precisava de um estímulo para ouvir com mais atenção, o recebi enquanto estavam no palco.
Mesclando faixas antigas e canções de seu último álbum, o The Cult é capaz de prender a sua atenção de forma interessante e muito disso se deve ao Billy Duffy. O cara veste todos os clichês que um guitarrista de hard rock pode ter. Encara o público, anda pelo palco deixando transparecer um ar de superioridade e ainda carrega o show de solos e riffs potentes. É aquele combo perfeito e que, quando é bem feito, chega a ser cativante.
O único clichê que ficou de fora do setlist foi “Painted On My Heart”, aquela música chiclete que foi trilha de filme e embalou alguns casais apaixonados por aí. No entanto, ninguém sentiu falta enquanto ouvia “The Phoenix”, “Peace Dog” ou “Sweet Soul Sister”, disso eu tenho certeza.
Pouco tempo após o fim do show do Cult, o telão começou a contar uma história para o público. Mesclando textos e fotos, o aquecimento para o show do The Who tinha começado com uma série de curiosidades em torno da banda e de seus integrantes. Ovacionados a cada foto, o baterista Keith Moon (morto em 1978) e o baixista John Entwistle (morto em 2002) eram lembrados com emoção por todos os presentes no Allianz… até que as luzes se apagaram.
O telão pedia para manter a calma, mas já era algo humanamente impossível naquele momento. Todo mundo estava pronto para embarcar no trem da história com uma das melhores trilhas sonoras possíveis e essa viagem começou já com a sensacional “I Can’t Explain”.
Em um setlist de vinte e duas músicas, foram vários os momentos de comoção do público ao início de uma faixa muito esperada. Para mim, a porta de entrada para o The Who foi “Who Are You”, música que ficou muito conhecida pela trilha de C.S.I., e já ouvir ela logo de cara demonstrava o poder de um setlist recheado de hits. “My Generation”, “Behind Blue Eyed”, “You Better You Bet”, “I Can’t See For Miles”, ‘The Rock” e “Amazing Journey” renderam momentos incríveis para se ver ao vivo. As duas últimas mostraram também outra escolha acertada do The Who: a sua banda de apoio. Competentes, os músicos não comprometerem em nenhum momento a apresentação, mas o destaque fica por conta do baterista Zak Starkey. O filho de Ringo Starr provou a sua qualidade ao longo do show e impressionou os presentes ao longo de “Amazing Journey”.
A parte final da apresentação foi simplesmente sensacional. Foi difícil segurar – novamente – as lágrimas ao longo de uma sequência com “Pinball Wizard”, “See Me Feel Me”, “Baba O’Riley” e “Won’t Get Fooled Again”. Ao meu lado, uma família com três gerações distintas curtia o show com a mesma emoção estampada nos olhos, mostrando o quanto o The Who é atemporal e como tudo aquilo que se via no palco era simplesmente histórico, independente da sua idade.
Para o bis, “5:15” e “Substitute” colocaram ponto final na apresentação que se tornou, fatalmente, um dos momentos mais especiais que já presenciei em um palco. Daltrey (73) e Townshend (72) ainda são fabulosos naquele espaço e, usando as palavras de Ian Astbury (ou do Billy Duffy, ainda não me lembro quem disse isso), obriFUCKINGgado ao The Who pela chance de ver aquilo que eu imaginava ser possível só pelos DVDs ou YouTube bem na minha frente.
Abaixo, veja os setlists dos três shows: