As melhores experiências de nossas vidas costumam acontecer a partir de imprevistos. Eu estava preparado para acompanhar o show de lançamento do EP Somos Estações, da Riviera, no meio do público, aproveitando meu 1,74m de pura vontade de tomar uma Heineken e simplesmente curtir a apresentação no belo Teatro Bradesco junto com as mais de 300 pessoas que apareceram lá na noite de quarta-feira, 13 de julho, o tal dia mundial do Rock. Mas como disse, imprevistos costumam mudar nossos planos e de espectador, me tornei parte da equipe de produção atuando como roadie do vocalista Vinícius Coimbra.
Me acompanhem: em pleno dia do rock, meu plano de curtir um show foi modificado para participar da produção do show mais importante da história da Riviera. Pelos meus cálculos, esse foi o melhor dia do rock da minha vida. Portanto, a análise dessa apresentação será a partir da perspectiva de um fucking roadie de uma fucking banda de rock foda pra caralho.
(Para quem não sabe, roadie é o nome daquelas pessoas que ficam atrás dos palcos carregando os instrumentos, afinando, ajudando na troca de guitarras/baixos durante as músicas. Está em exibição atualmente uma série chamada Roadies, que fala exatamente sobre essa galera)
Já tinha trabalhado como roadie antes, inclusive para a própria Riviera numa apresentação ao lado a Scracho, mas foi numa situação completamente diferente. Naquela época, a banda ainda não tinha a mesma força de hoje e sequer estava num palco como o do Teatro Bradesco. A equipe de produção tinha mais de dez pessoas, incluindo os técnicos da mesa de som, fotógrafos etc. Não poderia ser pra menos, afinal não é sempre que uma banda autoral consegue um espaço desses.
Os esforços começaram por volta das 13h e a preparação tomou a tarde inteira com os ajustes do volume (“mais bumbo”, pedia o baterista Tulio Braga) para o som ficar perfeito. O palco estava praticamente tomado pela quantidade de amplificadores, incluindo o espaço da cantora convidada Adriah e do tecladista Felipe Patrício. Trabalho em equipe é o ingrediente básico para o sucesso desses grandes eventos. Todo mundo andava de um lado para o outro, tentando solucionar qualquer questão, até mesmo as mais mínimas, como “não ter a menor ideia de onde estão” as garrafas de água para colocar perto da banda durante o show. E como fã de música, ter uma experiência dessas é algo muito especial.
Meu trabalho seria basicamente afinar as guitarras do Vinícius (duas afinações distintas, sendo que uma delas fica em DADF#Ad) , ajudar nas trocas de uma música para outra (ele usa duas guitarras PRS – uma marrom e uma branca), levar um banquinho e o violão (que aliás, me parecia a parte mais complicada porque envolvia plugar o instrumento no escuro. Sou meio cego, mas deu para resolver tudo bem rápido na hora), ficar atento para qualquer imprevisto com a guitarra do Rafa Giácomo, e qualquer outro imprevisto. Ao meu lado tinha a experiência do músico Tchello Millo, que estava por conta do baixista Rapha Garcia.
Uma dica importante para quem se aventurar como roadie é levar sempre seu próprio equipamento para não ter imprevistos. No caso, o Tchello estava com o afinador dele afiado para garantir as afinações pouco convencionais do Vinícius. Outras regras de ouro: tenham cordas de guitarras separadas (e treine em casa para não deixar para experimentar no meio de um show – especialmente se for algo como o lançamento do disco num puta teatro gigante lotado de gente); cabos, palhetas e fontes extras; e principalmente, conheça muito as músicas da banda. Gostar das canções é um diferencial, óbvio. Afinal, se você é um fã, a sensação de acompanhar os caras tocando bem de pertinho é uma experiência completamente diferente.
Era 21h10 quando a Riviera iniciou o show com “Do Revés”. A expressão no rosto de cada um era de satisfação. “Living the dream”, como disse o baixista numa postagem no Facebook. Costumo dizer sempre nas análises de shows que tanto quanto a música, a apresentação conta demais. Se você consegue convencer o público de que ama cada parte minúscula daquilo que está fazendo – especialmente as partes mais chatas e difíceis – já faz valer o ingresso. Se divertir fazendo um trabalho sério, bem feito e profissional é algo muito raro e especial. Riviera mostrou que preenche todos esses requisitos e ainda nessa primeira música já dava para dizer que a noite ficaria marcada não apenas pela importância do evento, mas como um dos shows mais empolgantes da banda até o momento.
Direto das coxias do teatro, me divertia apontando pro Tchello as caixas do baixo (dois Ampegão lindos) balançando. O repertório ia avançando com “Inimigo Perfeito”, “Brasília”, “Refém”, “Sei(S)”, “A Seco” (que permanece na lista das cinco melhores músicas da banda) e o single “Nunca Mais”. Os arranjos de guitarra recebem cuidado especial porque estamos falando de três guitarristas numa banda que já tem um baixo muito destacado. Há todo um cuidado para não colocarem coisas demais e acabar atrapalhando as músicas. Pena que o Breno Machado estava do outro lado do palco e não dava para ver de perto as maluquices dele, que foi o último a entrar na banda, mas se apresenta sempre com uma presença de palco absurda. E ele não se contenta apenas com a guitarra: em “Pra Sentir Melhor”, canção que incluiu também a participação do tecladista Felipe Patrício, Breno pega um baixo para tornar algumas partes ainda mais pesadas – embora seja provavelmente uma das músicas mais “mansas” da Riviera.
A reta final do show contou ainda com a participação especial da cantora Adriah, que veio direto de Brasília para encantar o público mineiro com a sua voz poderosa e que ficou ainda mais intensa com a acústica do teatro. Foram apenas duas músicas (“Gosto” e “Inevitável”), mas ficou aquele gostinho de quero mais. Adriah ainda participou do show da Riviera no dia seguinte, durante a AUDIOsessions, e fez uma apresentação solo na loja de instrumentos musicais Serenata.
O encerramento da noite ficou com “Do Céu ao Mar”, “Temporário” (senti fortes emoções de ter que entrar no meio da música para entregar a guitarra do Vinícius) e “Futuro”, sendo que as duas primeiras fazem parte da fase atual e mais pesada, enquanto a terceira já é “velha de casa”. Fim do show ainda teve tempo daquela famosa foto da banda e produção, e isso foi maneiro demais. Apenas nessa hora que consegui realmente perceber o quanto o teatro estava cheio. Sempre existe aquele clima de suspense antes de um grande show, né? Mas o público não decepcionou.
Essa noite do dia mundial do rock será inesquecível por muitos motivos e um deles será essa confirmação do quanto a Riviera amadureceu ao longo desses três, quatro anos que venho acompanhando o trabalho da banda. Fica aquela certeza de que o potencial deles é enorme e que estão apenas no começo do caminho. E sobre ser roadie, poxa, isso é legal pra caralho! Quero mais!