Não me lembro da primeira vez que eu ouvi falar da Nação Zumbi. Infelizmente, nem da primeira música deles que ouvi. Por essa falha da memória, parece que foi como mágica que a NZ apareceu na vida, causou um reboliço e me acompanha nos fones de ouvido desde então. Esse ano, em particular, está muito oportuno para voltar a ouvi-los e até vê-los ao vivo. Afinal, comemoramos os 20 anos de Da Lama Ao Caos e o lançamento do mais recente trabalho da banda, que leva seu próprio nome. E é sobre ele que tratarei nesse texto, sem a intenção de fazer uma avaliação técnica, mas de contar uma experiência.
Tenho tido um apreço muito grande pela primeira música dos discos que ouço. É interessante pensar que a ordem das canções tem um sentido, criam uma dinâmica dentro do ambiente em que a banda se mostra e se desenrola. E a primeira é a que abre o caminho, é a comissão de frente da escola de samba e a primeira cervejinha da sexta-feira depois do expediente. Por isso, encaro “Cicatriz” como a faixa que, de início, já mostra os rumos que as coisas irão tomar: o Nação Zumbi é uma obra madura e que encontrou uma saída diante de suas dores. A letra é direta, sem rodeios ela chega até nós e nos convida a lembrar das próprias cicatrizes e de como elas são a materialização das memórias, tanto das boas quanto das ruins. Nesse momento eu já me encontrava entregue e feliz apenas por estar ali, ouvindo toda essa belezura via streaming.
E com esse pique segui ouvindo as outras faixas e já recomendando (obrigando) os amigos a ouvirem também. A toada do Nação Zumbi nos colocam diante de diversos sentimentos. Em algumas canções os versos são cantados de forma triste e dolorida, como “hoje eu acordei sem imagem e sem som”, já outros são proferidos com coragem e otimismo “mesmo sabendo das dores do mundo, o sorriso vem sempre. Como a certeza do sol com os seus dentes quentes.” Por isso, não o considero um disco de canções de amor, como foi dito por aí. Tratar de sentimentos, nem sempre é falar do amor e de suas implicações. Carregamos conosco sentimentos tão particulares e intensos, que muitas vezes nem nome tem. Digamos que ele seja um disco íntimo sem ser intimista. A poesia das canções ressoa de forma interna, como algo que foi ingerido e aguarda a digestão. O que remete imediatamente aos órgãos ilustrados na capa do disco, guardados dentro de nós, assim como os sentimentos a que me referi. Humanos.
Repito, é íntimo sem ser intimista. Pois o Nação Zumbi afasta toda a noção da coisa insossa e morna que circunda uma apresentação intimista no momento em que o sangue quente e vermelho da NZ jorra. No fim, o disco me levou a pensar que a vida se mostra tão frágil em alguns momentos, mas a força de nossa existência provém das marcas que carregamos no corpo e na alma, por que não. Maduro, íntimo e visceral. É a NZ do começo ao fim.
Vai ver só escrevi tudo isso para, de alguma forma, marcar que estou presente em 2014, conectada, ouvindo e me embalando ao som dos pernambucanos. Se o primeiro momento ficou perdido em algum passado, esse está devidamente registrado e não vou mais me esquecer.
Nação Zumbi – Nação Zumbi
Lançamento: 05 de Maio de 2014
Gravadora: Som Livre
Gênero: Manguebeat / Rock
Produção: Berna Ceppas e Kassin
Faixas:
01. Cicatriz
02. Bala Perdida
03. O Que Te Faz Rir
04. Defeito Perfeito
05. A Melhor Hora da Praia
06. Um Sonho
07. Novas Auroras
08. Nunca Te Vi
09. Foi de Amor
10. Cuidado
11. Pegando Fogo