Quem não torceu o nariz quando ficou sabendo que o Primavera Sound São Paulo mudaria de lugar em sua segunda edição e seria no Autódromo de Interlagos? Ou quando viu o line, bem mais enxuto do que o da primeira edição? Ou quando viu o mapa e percebeu que os palcos estavam posicionados de uma maneira semelhante ao desastroso The Town?
Bom, meus amigos, se você, assim como eu, foi uma dessas pessoas, tenho um anúncio a fazer: pagamos a língua.
A segunda edição do Primavera Sound São Paulo, que aconteceu nos dias 02 e 03 de dezembro de 2023 na capital paulista, terminou com um saldo positivo. É claro, assim como na primeira edição, existem alguns pontos que precisam de correção, mas o Primy 2023 se saiu muito melhor do que o esperado, principalmente pela sua preocupação com o conforto do público e seu propósito de ser o que muitos festivais não são: um evento totalmente focado na música.
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Como foi o Primavera Sound 2023?
Porém, fora a dificuldade de chegar ao portão e entrar no festival, o final de semana foi uma sequência de agradáveis surpresas que foram da distribuição de água aos shows que aconteceram durante o final de semana. Apesar de não ter tantas atrações quanto sua edição anterior, o foco na música — que foi motivo de elogios na edição de 2022 — continuou sendo o ponto positivo do Primavera Sound.
Com shows esperados de artistas como The Cure e Carly Rae Jepsen, além da volta do Cansei de Ser Sexy aos palcos depois de um hiato de quatro anos, o principal ponto positivo do Primavera foi a variedade de estilos musicais e das apresentações dos artistas que se apresentaram no festival. Nem mesmo cancelamentos repentinos — como o da banda MUNA ou de Grimes, anunciada como uma das headliners — prejudicaram o line cheio de estrelas e nomes promissores da música nacional e internacional.
Entre os shows que se destacaram no festival estão, é claro, The Cure, mas também o The Hives, que fez uma apresentação enérgica debaixo do sol da tarde de sábado, Carly Rae Jepsen, uma diva pop com números de artista independente que arrastou uma multidão de fãs para o Primavera, Slowdive, que não foi prejudicado nem com a vocalista Rachel Goswell impossibilitada de cantar.
Marisa Monte — que chamou Roberto de Carvalho, viúvo de Rita Lee, para o palco em uma linda homanagem à cantora que nos deixou no início do ano — também fez um show impecável, cantado do começo ao fim pelo público; Marina Sena, que se disse uma “arroz de festa” de festivais, continuou sua tradição de fazer ótimas apresentações neles, e Mc Carol, que fez um show divertidíssimo no palco TNT Club, completam essa lista.
Marisa Monte acaba de chamar Roberto de Carvalho ao palco para homenagear Rita Lee.
Juntos, eles cantam Doce Vampiro. pic.twitter.com/KSeBplVufF— Audiograma (@audiograma) December 2, 2023
Até mesmo The Killers, um rock farofa de estádio meio deslocado no line mais que alternativo do Primavera Sound, se saiu bem com todo o carisma de Brandon Flowers, seu setlist lotado de hits e a ousada escolha de começar o show com “Mr. Brightside”, o maior hit da banda.
Por sua vez, o palco TNT Club merecia mais destaque no festival. Com um line cheio de apresentações de artistas como Urias e Rebecca, e DJs como Gabriel do Borel, Mu540 e KL Jay, o palco, uma tenda relegada ao canto do Autódromo, recebeu shows dançantes que, muitas vezes, eram mais interessantes de se assistir do que as apresentações nos palcos principais.
Por último, vale fazer algo que nunca pensei que faria na minha vida: elogiar as ativações de marca. Sim, os estandes de patrocinadores merecem elogios dessa vez.
Não houve um estande que atrapalhasse a experiência com a música durante o festival e todos ofereciam serviços e brindes úteis para quem ficou horas e horas debaixo de sol assistindo aos shows. O estande de Hellmann’s oferecia molhos para colocar em lanches e refeições e ficava localizado exatamente ao lado de onde esses produtos eram vendidos; Neutrogena distribuiu protetor solar para o público; Corona, em uma ação que marcava a sustentabilidade promovida pelo Primavera Sound, montou um bar em que bastava comprar uma cerveja para ganhar um copo retornável que podia ser usado em todo o festival.
Com seu foco total em música boa, sem filas gigantescas para tirolesas ou para rodas gigantes posicionadas na frente do palco, sem pessoas que estavam ali reclamando de outras bandas enquanto o headliner não subia ao palco, e, principalmente, sem 100 mil pessoas espremidas em um espaço que suporta apenas metade disso, essa nova versão do Primavera Sound conquistou meu coração que ainda dói de saudade quando eu penso em sua primeira edição.
Quais foram os pontos positivos do Primavera Sound 2023?
Mesmo com o lineup mais enxuto do que o de sua primeira edição, o Primavera Sound 2023 deu conta de agradar a todos os públicos com os artistas variados que colocou em seus palcos. Havia shows para o pessoal do rock, do punk, para quem curte MPB, para quem preferia funk e até mesmo para quem gostava música experimental.
Além de serem ótimos nomes, todos fizeram shows impecáveis, que agradaram seu público, o público que estava só de passagem ou buscando algum lugar para descansar no intervalo entre um show e outro e até mesmo o público que não conhecia os artistas. É o que se espera de um festival: a chance de ouvir seus artistas favoritos e conhecer seu próximo artista favorito. E isso o Primavera Sound sabe entregar muito bem.
Metric tocando “Black Sheep” no Primavera Sound São Paulo.#PrimaveraSound pic.twitter.com/2bk0lApAo1
— Audiograma (@audiograma) December 2, 2023
Palco TNT Club
Patrocinado pela TNT, o palco TNT Club tinha um line espetacular com grandes nomes da música brasileira. VHOOR, Mc Carol, Urias, Mu540, Cherolainne e KL Jay são apenas alguns dos nomes que se apresentaram na tenda, que trouxe dance, eletrônica, reggaeton, techno, house e funk para o Primavera Sound.
Quase como uma versão do palco Elo, que esteve presente na primeira edição do festival, o TNT Club teve ótimos shows e deu um grande destaque para gêneros musicais com raízes brasileiras e latinas, colocando ainda mais diversidade no line do Primavera Sound.
Apesar de tudo isso, esse palco era um espaço mínimo, meio escondido e deixado no canto do Autódromo, mesmo com todo o potencial e os nomes para ser um palco maior ou em um local de mais destaque no festival. Uma correção a ser feita na próxima edição do Primy.
Distribuição de água
No primeiro grande evento na cidade depois da portaria que obriga a distribuição gratuita de água em eventos feitos em dias de calor (e debaixo de um calor de 33°), o Primavera Sound não decepcionou em disponibilizar água para seu público.
As áreas de distribuição de água gratuita estavam bem localizadas, os funcionários te ofereciam mais que um copo de água para levar, mesmo sem necessidade, já que eram estações próximas uma da outra e era difícil andar mais de 500 metros sem encontrar alguém te entregando água.
Vale lembrar que, em 2022, o Primavera Sound também disponibilizou bebedouros pelo Anhembi, ou seja, disponibilizar água gratuita para o público já era uma prática comum do festival antes.
Sem super lotação
Espaço para andar livremente, para sentar no chão e descansar entre um show e outro, filas que andavam rapidamente… O Primavera Sound foi um festival confortável para quem esteve nele e isso se dá pelo fato de que não houve super lotação no espaço reservado para ele. Mesmo com palcos próximos uns aos outros e uma área muito menor do que a usada para o Lollapalooza, por exemplo, não houve nenhum problema de acúmulo de pessoas. Um ponto que deve ser considerado por todo festival ou show que acontece.
Quais foram os pontos negativos do Primavera Sound 2023?
Como sempre, o acesso ao Autódromo foi o grande ponto negativo de todo evento que acontece por lá. O problema não foi o caminho de trem: este estava vazio, e, como sempre, foi fácil de ser feito. O problema é que subir ruas e mais ruas debaixo de sol em uma caminhada de cerca de 15 minutos é uma tortura que te faz chegar no festival já exausto.
Som vazando de um palco para o outro
Apesar dos palcos próximos facilitarem na corrida de um show para o outro, no Primavera Sound o som vazava. Ou seja, era possível ouvir o set da DJ The Blessed Madonna enquanto o The Cure tocava, ou ouvir o que acontecia no show do The Killers durante o show do Mc Bin Laden.
se o som do Palco TNT vazar hoje, a gnt vai poder ouvir o mashup ao vivo de liga pra samu com friday I’m in love #PrimaveraSoundSaoPaulo
— pirigótico (@gugadad) December 3, 2023
Headliners de palcos secundários
Apesar do bom lineup, um dos erros do Primavera Sound foi não colocar nomes de peso para tocar nos outros palcos enquanto o headliner se apresentava no palco principal. Isso rendeu shows vazios no palco São Paulo, enquanto uma multidão assistia ao show no palco Corona, onde The Killers e The Cure fecharam a noite.
Preços
Preços padrões de festivais, é claro, mas é inegável que pagar R$18 numa cerveja meio quente ou R$34 num cheese burger feito com hambúrguer de mercado é algo absurdo. Fora as camisetas oficiais do merch das bandas, que custavam a partir de R$150.
Banheiros
O banheiro fixo do festival é uma evolução em relação aos banheiros químicos que existiam no Autódromo. Mas, a falta de limpeza e manutenção deles acaba os tornando um ponto negativo: todos muito sujos, sem travas nas portas, sem papel higiênico e sem sabão para lavar as mãos.
Qual o saldo final da segunda edição do Primavera Sound?
Mas, tive que aprender algo antes: é preciso esquecer a primeira edição do Primy para ficar feliz com o que vai acontecer daqui para a frente com o festival. Aquilo foi um acontecimento único, uma edição histórica que nunca vai se repetir, um Woodstock moderno (e bem gay) sobre o qual vamos falar sobre daqui uns anos de maneira saudosista.
A partir de agora, teremos um festival diferente, com menos atrações e, talvez, que aposta mais em nomes clássicos do que em ser uma amostra do que há de interessante na música contemporânea. É quase como se estivéssemos vendo a estreia de um festival novo, e não a segunda edição de um que já nos conquistou. E está tudo bem.
É um festival organizado, onde podemos curtir nomes que fazem parte das nossas playlists (ou das playlists dos nossos pais) e conhecer novos nomes confortavelmente, enquanto andamos com nossos amigos e bebemos cerveja cara e meio morna.
É bom! É divertido! É o espírito dos festivais! Desde que o foco continue sendo em música, nós vamos sobreviver a tudo que o Primavera nos oferecer.
Primy, meu querido: nos vemos em 2024!