O que te faz afirmar que uma música é boa ou ruim? A letra? A banda? A parte instrumental? O contexto da obra? Ou simplesmente basta você gostar dela para dizer que é excelente?
A verdade é que existem diversos motivos para chegarmos a uma resposta, seja ela subjetiva ou não. Eu gosto de considerar uma combinação de todos esses fatores citados, mas existe outro ponto capaz de transformar uma música boa ou excelente em uma música inesquecível para a vida toda.
Anos atrás, quando a Essa me Lembra Você nasceu, eu buscava o amor como forma de preencher a minha própria existência. Algo como precisar ter alguém. Isso nunca me impediu de ser um babaca egoísta praticante do poliamor sem comunicar minhas respectivas namoradas. “Bom, pelo menos eu transava”. Melhor, eu transava sem medo de ter um ataque cardíaco e tornar real uma das minhas piadas autodepreciativas favoritas. Felizmente, a gente amadurece. Um pouco.
Essa coluna era muito sobre compartilhar a busca pela ideia do amor como justificativa para existir. Quando releio os textos antigos fico tentando me reconectar com esse cara que escrevia histórias hilárias cheias de azar romântico. A real é que sou 95% diferente atualmente. Meu egoísmo me impede de conectar música com outra pessoa. É um mecanismo de defesa, na verdade. A arte é a única certeza quando tudo dá errado e as consequências chegam. Deus me livre de estragar meu conforto.
Felizmente (ou não), ainda tenho boas histórias jamais contadas relacionando gente com arte. Em um mundo careta e cheios de retrocessos quando confundimos respeito e luta por direitos iguais com censura ou cancelamento, será um exercício curioso falar de como era ser solteiro dez anos atrás. Porém, hoje eu não quero falar de gente. Quer dizer. Vou falar de gente, mas só do Roger Waters mesmo. Vamos falar de arte.
Em outubro de 2018, Roger Waters visitou o país para uma série de apresentações, incluindo um show surreal no Mineirão. Os shows foram na véspera daquelas eleições conturbadas que nos condenaram a quatro anos de um governo avestruz: todos com suas respectivas cabeças atoladas no cu de um ministro, miliciano, corrupto, terraplanistas, e Olavetes, claro.
Waters incomodou demais seus “fãs” conservadores, que não concordavam com suas opiniões políticas. Aff. Eu não vou entrar nisso. Chega. Não tomei meu remédio para a pressão hoje.
O que eu quero compartilhar é a lembrança de “Another Brick in the Wall”, uma das canções mais famosas do Pink Floyd. Aquela que todo mundo vai responder depois de serem perguntados “Qual sua música preferida do Pink Floyd?”, saca? Nunca desgostei, mas ela também nunca foi das minhas favoritas do mundo. Sem dúvidas, é maravilhosa. Lembro de ter prestado atenção nela pela primeira vez em 1999, quando estreou o filme Prova Final (The Faculty, Robert Rodriguez, 1998). O KoRn fez uma releitura pesadona e tal, acho que até preferia ela do que a original. Mas minha opinião sobre esse clássico mudou MUITO depois do show.
O contexto do nosso país somado com o medo/insegurança pediam por mensagens de otimismo. A arte cumpriu bem o papel dela de confortar e dar esperança. No final da música, os jovens que estavam no palco mostraram suas camisetas pretas com o texto “Resist”. E isso, meu amigo, minha amiga, foi o suficiente para elevar “Another Brick in the Wall” para um dos momentos mais arrepiantes que a música me proporcionou. O poder de UMA palavra é inexplicável. As coisas que a arte causa na gente é inexplicável.
Acho que até o mais obtuso dos eleitores do vizinho do assassino da Marielle sentiu um pouco de emoção, mas provavelmente confundiu com gases e aceitou peidar em paz com seus pensamentos e ideias.
Essa me lembra você, Rogério. Você e esse seu show maravilhoso. Você e uma das minhas lembranças favoritas de um show foda pra caralho.