Acredito em Karma com a mesma fé que sei que eventualmente levarei um prêmio da loteria da Caixa. Por isso, como um apaixonado por música e eventos ao vivo, eu não me perdoaria se perdesse mais um show do Paul McCartney no Brasil. Ainda mais quando ele vem tocar em Belo Horizonte. E digo mais. Vem tocar na casa nova do Clube Atlético Mineiro, a linda Arena MRV. Se eu perdesse o show, acredito que o meu destino seria sofrido tanto em próximos shows quanto torcendo para o Galo.
Com um atraso de 70 minutos no tempo programado, o ex-Beatle subiu ao palco para iniciar uma verdadeira maratona pela história da música. Às vezes, a gente lê uma review de um show e encontra aqueles clichês repetidos tantas vezes que deixam de ter importância. Mas desta vez, não tem como ser diferente. Ver Paul McCartney ao vivo, definitivamente é ver a origem de 90% das músicas que gostamos.
Com incríveis 81 anos de idade, McCartney canta e toca seu lendário baixo Hofner como se não houvesse amanhã. Confesso ter ficado com uma curiosidade imensa para descobrir mais sobre a dieta e atividades físicas da lenda. Quero a mesma coisa para minha vida. Como grande showman, ele aproveita os intervalos entre as músicas para interagir com o público. “Eu vim aqui para falar uai” é o tipo de saudação que deixa todo mundo empolgado. Não que precisasse de esforço para ganhar o público, mas esses cuidados funcionam demais para quem tá lá vivendo a experiência de um grande show pela primeira vez. Faz cada um se sentir especial, sabe?
McCartney também desfila talento no seu piano, guitarra, violão e ukulele. Músicas como “Maybe i´m Amazed”, “Something” (um arranjo lindo, lindo) e “Live and Let Die” ficam ainda melhores ao vivo, o que é um feito e tanto, considerando a qualidade das gravações. É até injusto que as partes mais legais do show sejam com McCartney longe do seu baixo. Tudo bem. Não faz diferença para 90% das pessoas que nunca escutam o som do instrumento, mas para quem gosta…
Aliás, enquanto variava canções dos Beatles (muitas delas não tão conhecidas) com seus outros projetos, percebi o óbvio. Mesmo com Paul McCartney no palco, a maioria das pessoas ao meu redor pareciam depender de estímulos fortes para calarem suas bocas e prestarem atenção no show. Se fossem apenas adolescentes, eu entenderia como uma consequência dos nossos vícios e dependências de smartphones, mas eram adultos. “Espera que o show vai melhorar daqui a pouco. Tem mais músicas dos Beatles”, disse um sujeito para uma moça em coma emocional reclamando de ficar em pé.
Mas nem tudo está perdido. Um pouquinho mais longe estava uma mãe com seu filho. O moleque deve ter uns 7, 9 anos, usava uma boina preta e acompanhava a mãe nas dancinhas. A alegria contagiante da dupla quase me fez pensar na experiência de ter um filho e compartilhar o amor pela música, mas os adolescentes perto de mim trataram de reforçar o decreto de “Não vá se Reproduzir”. Também sorri com um tiozinho com a coreografia mais desajeitada que já vi nada vida enquanto McCartney tocava “Ob-La-Di, Ob-La-Da”.
Falando em coreografia, o baterista Abe Laboriel Jr. foi o cara da noite. Com seu famoso senso de humor, não se contentou em fazer caras e bocas: em uma parte do show, ele fez um verdadeiro número musical, imitando (toscamente) as coreografias de “Macarena” e outras dancinhas, o que foi realmente muito engraçado. Por conta de uma indisposição, o filho do lendário Abraham Laboriel usou apenas UM braço para tocar a bateria. O cara é tão bom que nem deu para “sentir” a diferença. Inclusive, ele deveria dar umas aulas para o baterista arrombado do Blink 182 e seu fetiche em cancelar shows no Brasil.
Meu momento favorito da noite ficou para o dueto com John Lennon em “I’ve Got a Feeling”, uma música que aprendi a gostar muito depois do documentário dirigido por Peter Jackson. As maravilhas da tecnologia permitem trazer o passado para o presente, embora flerte com uma ideia de futuro bem fake. Mas vamos curtir o que temos hoje, no caso, um Paul McCartney inspirado e com muita disposição para deixar a lembrança de um show inesquecível. Eu acho que ele conseguiu isso, sabe?
Por fim, imagino que seja uma curiosidade dos mineiros em saber como é voltar da Arena MRV depois de um grande evento. Em comparação com o Mineirão, não posso afirmar com certeza, mas existem pontos melhores e outros piores. Por exemplo, a saída ser apenas pela avenida Juscelino Kubitschek criou um engarrafamento gigante. Todo mundo saiu e foi para o mesmo lugar. Para um evento com 40 mil pessoas, era de se esperar que a Prefeitura tivesse um cuidado especial e garantisse o Metrô, mas esqueci que foi privatizado, né? Se era ruim antes, quem diria que ficaria pior? Ah, claro. O ponto positivo é que a Arena MRV é linda demais, uai.