Na última semana, as redes sociais foram tomadas de manifestações de preocupação sobre o local do MITA São Paulo. Agendado para os dias 3 e 4 de junho, em 2023 a segunda edição do festival mudou de lugar e agora acontecerá no Novo Anhangabaú, localizado no centro da cidade.
Apesar de ser um lugar com fácil acesso, a escolha do Novo Anhangabaú pela organização do festival — que trará estrelas da música como Lana Del Rey e Florence + the Machine — foi recebida por grande receio por seu público. Isso porque, nos últimos meses, o centro de São Paulo foi tomado por uma onda de violência: crimes e assaltos acontecem todos os dias, com cada vez mais frequência, e tem não só preocupado, como também assustado a população.
Qual é o local do MITA São Paulo?
O local do MITA São Paulo é o Novo Anhangabaú. Localizado no centro de São Paulo, ao lado da estação Anhangabaú e de uma das saídas da estação São Bento do metrô, “Novo Anhangabaú” é o nome dado ao Vale do Anhangabaú, que, nos últimos anos, passou por uma grande reforma para permitir que o local passasse a receber mais eventos voltados ao público.
Antes da reforma, o Anhangabaú — que é visto como o ponto exato da divisão entre o centro antigo e o centro novo da cidade — foi palco de shows de Anitta, Caetano Veloso e Anavitória, bem como de manifestações políticas, como as Diretas Já.
Segundo o site do local, a ideia é que em 2023 o Anhangabaú receba mais de 300 eventos para atender todos os públicos, em todos os dias da semana. Entre eles, estão eventos privados: o Ultra Brasil, por exemplo, acontecerá lá. Já segundo o MITA, o festival será realizado no local para “celebrar o centro histórico e enérgico de São Paulo”.
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O que está acontecendo no centro de São Paulo?
É possível entender o medo que a população enfrenta do centro de São Paulo através de números: calcula-se que um celular seja roubado por lá a cada 4 minutos. Em 2022, 16 assaltos foram registrados por hora na cidade. No último ano, 40 restaurantes fecharam as portas com medo da violência — algo que se refletia também na clientela, que sumiu com o passar do tempo. Os dados sobre ocorrências policiais, que eram reportados mensalmente, agora serão divulgados semanalmente na tentativa de elaborar um plano de segurança na região.
No último dia 7, vídeos de saques em uma farmácia e em um mercado na Avenida São João chocaram não só quem vive em São Paulo, mas todo o país. Nas semanas anteriores, as emissoras de televisão mostravam todos os dias vídeos de assaltos violentos pelas ruas junto a depoimentos de vítimas. A cada dia, uma nova gangue era mostrada: a gangue da bicicleta, com seus roubos de celulares, se tornou a mais popular entre elas.
A dispersão da Cracolândia, que se iniciou em 2017 após um ato do governo da época, é vista como um dos principais motivos para o aumento da violência — e também um desafio de mais de 30 anos que ninguém sabe como enfrentar. Apesar da declaração do prefeito da época de que a Cracolândia não voltaria a existir, ela apenas se concentrou em outros pontos da cidade, criando assim várias mini Cracolândias, que, além de dificultar a ação de quem trabalha com dependentes químicos, aumentou o número de áreas que passaram a ser evitadas na cidade devido à violência da região.
Recentemente, um relatório da Defensoria Pública do Estado de São Paulo apontou violações de direitos humanos no atendimento e tratamento de pessoas em situação de rua e dependentes químicos que vivem na Cracolândia. Na República, os seguranças do Copan avisam quem anda com o celular na mão que há assaltos acontecendo. Nas redes sociais, os relatos de assaltos e outros atos de violência se espalham pelo Twitter e TikTok juntamente à dicas para sobreviver na região. A principal delas? Evitá-la a todo custo.
Em resumo, o centro de São Paulo está abandonado. Com cada vez mais comércios fechando as portas (muitos justamente devido à falta de segurança) e pessoas evitando o lugar, quem trabalha por lá, mora por lá ou só costuma frequentar as ruas, seja durante o dia, seja durante a noite, está largado à própria sorte.
A Prefeitura — que, impressionantemente, está localizada no Viaduto do Chá, um dos principais pontos da região central da cidade — não parece interessada em fazer a zeladoria do próprio endereço, muito menos de seus arredores. O que fazer com São Paulo é uma pergunta que ronda a mente de todos os seus moradores, menos de seu desconhecido prefeito e de seu governador turista, que parecem não só desconhecer a cidade que governam, como também ignorar seus problemas (enquanto tentam descobrir o que mais pode ser privatizado).
Como era o centro de São Paulo?
Não faz muito tempo que o Centro de São Paulo — região que compreende locais como a Praça da Sé, República, Liberdade, Santa Cecília, Bela Vista e Consolação, bem como pontos turísticos populares — era visto como uma referência para eventos culturais.
Haviam bares, baladas e restaurantes abertos, festivais, shows, peças de teatro, feiras culturais e de rua, exposições, coletivos artísticos, entre outras manifestações culturais acontecendo todos os dias e noites em suas ruas e prédios, que vão de locais históricos como o Theatro Municipal e a Galeria do Rock à unidades do SESC, que oferecem atividades culturais a baixo custo.
O Centro também era o local da Virada Cultural, um evento anual promovido na cidade que trazia diversas atrações e manifestações culturais por 24 horas ininterruptas, fazendo com que pessoas madrugassem nos bairros centrais para assistir a shows de artistas como Emicida, Baby do Brasil, Racionais MC’s, Elza Soares, Gilberto Gil, Valesca Popozuda e Anitta, além de poder assistir artistas independentes de diversos gêneros musicais, intervenções artísticas, peças teatrais etc.
Porém, devido às mudanças de governo municipal, estadual e federal e ao baixo investimento dedicado à área da cultura, todas essas ações foram, com o passar do tempo, perdendo sua força.
A falta de investimento em cultura não é o único fator que deu origem ao problema que o centro enfrenta agora: ela também é resultado de anos de negligência das autoridades governamentais, de uma crise econômica causada pelas terríveis medidas adotadas pelo último governo federal, por uma pandemia mal gerida, má gestão da segurança pública, falta de políticas públicas para a população em situação de rua e, principalmente, para as pessoas que, além de viver na rua, enfrentam a dependência química.
O que o MITA diz?
No dia 11 de abril, um comunicado foi postado nas redes sociais do festival afirmando que a segurança do público é a prioridade da organização do evento. O comunicado afirma também que as medidas necessárias para garantir isso estão sendo tomadas junto à Prefeitura e que a organização está ciente dos problemas da região.
Leia o comunicado publicado no Twitter na íntegra:
“Queremos que todos tenham uma experiência incrível com a gente e, para isso, o bem-estar é primordial. Ouvimos as preocupações de quem está inseguro com o festival no Novo Anhangabaú e estamos tomando as medidas necessárias.
A escolha do Novo Anhangabaú foi feita com a intenção de celebrar o centro histórico e enérgico de São Paulo. Acreditamos que festivais como esse são importantes para a cidade.
A organização está ciente dos problemas na região. Por isso, estamos juntos com a Prefeitura de São Paulo trabalhando pela segurança de todos. Conforme nos aproximamos da data do festival, traremos mais detalhes sobre o assunto aqui em nossas redes sociais.
A segurança de vocês é uma de nossas prioridades e estamos tomando todas as medidas necessárias.
Agradecemos pela compreensão e esperamos vocês para, juntos, colocarmos a música no centro — de todas as maneiras possíveis.”
Nessa semana, foi divulgado o mapa do Ultra Brasil, festival de música eletrônica que acontece nos dias 21 e 22 de abril, no mesmo local do MITA São Paulo. O mapa do local nos permite ter uma ideia de como será o acesso ao Anhangabaú, além de indicar também pontos de policiamento ao redor, que devem ser os mesmos dos dias 3 e 4 de junho.
Quais cuidados tomar para ir ao MITA?
Tendo todos esses fatos em mente, é importante observar que, até o presente momento, não há previsão de mudança de local do MITA São Paulo.
Quem vai ao festival pode tomar alguns cuidados para evitar sofrer com a violência da região. Reunimos algumas dicas que são divulgadas em épocas de grandes eventos, como Carnaval, e que podem te ajudar a evitar assaltos e outras agressões na região do MITA:
- Leve apenas documentos importantes;
- Combine um ponto de encontro algumas estações antes da estação Anhangabaú;
- Não use o celular fora da área do evento;
- Use uma doleira, que é uma espécie de pochete que fica escondida dentro da roupa, dificultando roubos;
- Dê preferência a pagamentos em dinheiro;
- Não ande sozinho pela região do Anhangabaú e prefira estar sempre em grupos grandes;
- Avise para alguém sobre o caminho que você vai fazer para chegar e ir embora do festival;
- Nunca reaja a assaltos!
Uma breve opinião
Ao escolher o Anhangabaú como local do MITA São Paulo e defender essa decisão utilizando o argumento “precisamos celebrar o centro de São Paulo”, a organização do evento está levando o nome Music is the Answer ao seu sentido mais literal possível. E isso é algo negativo.
Sim, há a necessidade de celebrar o centro histórico de São Paulo. Afinal, foi dessa maneira que ele teve seus dias de glória há poucos anos. Porém, fazer isso em um momento de tamanho abandono do lugar, sem que existam políticas públicas responsáveis por incentivar essa celebração, é dar uma solução simplista para um problema enraizado na cidade de São Paulo.
A celebração proposta pelo MITA neste caso não é um ato de amor ou respeito ao centro de São Paulo e sua história: ela mais parece uma uma maneira de reduzir ao máximo os custos de um festival que se encaixaria em outros locais da cidade que são vistos como mais seguros no momento, como o Anhembi ou o Memorial da América Latina, além de, claro, uma maneira de colocar em risco não só os frequentadores do festival, mas também seus colaboradores, prestadores de serviço, artistas e suas equipes.
Porém, é compreensível que um evento privado surgira uma solução simplista para esse problema ao ser questionado sobre ele. Afinal, além da violência na cidade ser um problema com o qual ele deve apenas lidar e não resolver, as soluções dadas pelas autoridades são milhares de vezes piores e até mesmo ridículas: a sugestão de criar um programa para empregar pessoas em situação de rua da cidade de São Paulo em propriedades agrícolas de cidades do interior dada pelo governo estadual é a prova de que estamos lidando com pessoas que não têm ideia do que estão fazendo em suas funções.
O Ultra, festival que acontecerá nos dias 21 e 22 de abril e é organizado pela mesma produtora, será usado como um termômetro para a questão da segurança do MITA. Resta acompanhar o andamento dele, os depoimentos nas redes sociais e torcer para que estejamos errados sobre nossos temores em relação ao MITA.
Artistas fazem pedidos especiais para a produção do MITA
Em tempo, a produção do festival divulgou os pedidos feitos pelos artistas, com foco no cardápio que será disponibilizado para alguns deles.
Entre os pedidos, chama a atenção o cuidado com a sustentabilidade das atrações: Florence + the Machine pediram que garrafas de água, tigelas e pratos fossem todos de vidro ou porcelana e a banda BADBADNOTGOOD solicitou que nenhum plástico descartável fosse usado e que tudo fosse compostável ou reciclável.
Entre as comidas, Lana Del Rey pediu pizza (só de queijo, ou seja, nada de experimentar as peripécias que nós brasileiros fazemos com pizza) e macarrão; Planet Hemp expandiu o cardápio de pizzas e pediu de muçarela e calabresa, além de diversos tipos de frutas; Florence + the Machine pediram comida tailandesa e sushi e o BBNG quer experimentar queijos locais.
Sobre o MITA
Depois de sua edição de estreia em 2022 com Gorillaz e The Kooks no line-up, o MITA apresenta sua segunda edição nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
Lana Del Rey e Florence + The Machine lideram o line-up, que também é formado pelas irmãs HAIM, em sua primeira vez no Brasil, Flume, The Mars Volta e Sabrina Carpenter. Entre as atrações brasileiras estão Arthur Verocai, Jorge Ben Jor, Planet Hemp, Duda Beat, Djonga e o retorno do NX Zero.
O MITA acontece no Rio de Janeiro, no Jockey Clube, nos dias 27 e 28 de maio, e em São Paulo nos dias 3 e 4 de junho.
Serviço: MITA São Paulo
Data dos shows: Dias 3 e 4 de junho (sábado e domingo)
Abertura dos portões: 11h
Horário dos shows: a partir das 12h
Local: Novo Anhangabaú – Vale do Anhangabaú, centro histórico de São Paulo
Classificação etária: Acima de 16 anos desacompanhado. De 5 a 15 anos é obrigatória a presença de um responsável legal.
Ingressos: A partir de R$ 350,00
Capacidade: 30 mil pessoas
Serviço: MITA Rio de Janeiro
Data dos shows: Dias 27 e 28 de maio (sábado e domingo)
Abertura dos portões: 11h
Horário dos shows: a partir das 12h
Local: Jockey Clube – Praça Santos Dumont, número 31, Gávea, Rio de Janeiro – RJ
Classificação etária: Acima de 16 anos desacompanhado. De 5 a 15 anos é obrigatória a presença de um responsável legal.
Ingressos: A partir de R$ 350,00
Capacidade: 20 mil pessoas