Após a 62ª edição do Grammy, Tyler The Creator chamou atenção por uma fala: “É ruim que, quando nós fazemos algo que transcende gêneros, sempre nos colocam na categoria de rapper ou urbano”.
A declaração, dada após Tyler receber o prêmio de Melhor Álbum de Rap por IGOR — um disco que passeia entre estilos como R&B, pop e até mesmo no rock —, não foi a primeira e possivelmente não será a última a protestar sobre algo que há anos causa controvérsias e reclamações tanto dos artistas quanto do público: o racismo e a falta de diversidade presentes no Grammy.
Um ano depois desse acontecimento, a Recording Academy decidiu criar regras e diretrizes para se comprometer com a ideia de “evoluir de acordo com a paisagem musical” — uma maneira elegante demais de dizer que eles pretendem finalmente abrir o leque de diversidade de seus indicados.
O resultado dessas novas regras pode ser visto na edição atual da premiação: apesar de terem ignorado grandes e bem sucedidos discos de artistas negros ou que supostamente não pertenciam ao eixo anglo-estadunidense do mercado da música, o Grammy de 2021 trouxe um quadro de nomeados variado.
Artistas negros estão presentes nas quatro principais categorias — Álbum do Ano, Gravação do Ano, Música do Ano e Artista Revelação — representando gêneros musicais que passam pelo soul, R&B, rap, eletrônico e pop; a artista que mais recebeu indicações no ano foi Beyoncé, que dispensa apresentações, com nove nomeações, seguida por Taylor Swift, Dua Lipa e pelo rapper Roddy Ricch, cada um com seis; e, pela primeira vez na história da premiação, a categoria Melhor Performance de Rock tem apenas mulheres, ou bandas lideradas por elas, entre os indicados.
É justo dizer que o Grammy de 2021 fez algo histórico ao, pela primeira vez, deixar os homens fora dos holofotes ao menos nesta categoria. Até porque, apenas três anos atrás, essa mesma Academia teve um presidente que declarou que mulheres precisavam se impor na indústria da música.
As Indicadas à Melhor Performance de Rock
Brittany Howard
A vocalista do Alabama Shakes, concorre com “Stay High”, música de seu disco solo Jaime. Talvez, pelo disco ser em sua totalidade um trabalho experimental com raízes no synth-rock e no R&B, “Stay High” seja a música que mais se aproxima do trabalho do Alabama Shakes, se assemelhando principalmente ao disco Sound & Color, de 2015, tanto por sua letra quanto pelo seu instrumental.
Somando as indicações recebidas junto à banda, Brittany já foi nomeada a nove e venceu quatro Grammys.
Phoebe Bridgers
Um dos principais novos nomes do rock, Phoebe Bridgers, que tem chamado atenção por suas performances — incluindo a apresentação no Saturday Night Live onde dividiu opiniões ao quebrar uma guitarra —, foi nomeada por “Kyoto”, faixa de Punisher que fala sobre a complicada relação da artista com o pai e que foi escolhida como uma das melhores músicas de 2020 por veículos como a Rolling Stone, a Billboard, a Consequence of Sound e por nós do Audiograma.
Big Thief
Liderados por Adrianne Lenker, os nova iorquinos do Big Thief estão fazendo sua segunda aparição seguida no Grammy. Após terem seu terceiro disco, U.F.O.F., nomeado na categoria Melhor Álbum Alternativo em 2020, foi a vez de “Not”, faixa do disco Two Hands, de 2019, ser indicada. Estruturada em volta da palavra “não”, a composição de Adrianne usa seus seis minutos de duração para falar sobre negação, preferindo evocar mistérios ao deixar coisas sem serem ditas.
Grace Potter
Nove anos após ganhar uma indicação em Melhor Performance de Country de Grupo ou Duo, a ex vocalista do Grace Potter and the Nocturnals conquistou suas duas novas indicações com o disco Daylight, de 2019, e sua faixa título.
Escrita por Grace depois dos considerados “dolorosos” processos de separação da banda e do fim de seu casamento, “Daylight”, a música, é um retrato extremamente pessoal dos seus quatro anos que se passaram antes de seu lançamento.
HAIM
Se passaram dois discos e seis anos da indicação como Artista Revelação em 2015 até que as irmãs que integram o HAIM, uma das mais celebradas bandas do gênero atualmente, voltassem a ser indicadas ao Grammy.
Conduzida por um divertido e, segundo Danielle Haim, “direto” riff de guitarra, “The Steps”, do Women In Music pt. III, pode ser a chance de Danielle, Este e Alana ganharem o Grammy, já que as chances do Women In Music pt. III vencer do Folklore de Taylor Swift como Álbum do Ano são praticamente nulas.
Porém, existe Fiona Apple.
Fiona Apple
“Shameika”, o grande destaque de Fetch the Bolt Cutters, é o exemplo perfeito da capacidade que Fiona possui de contar histórias: acompanhada de um piano e de certa cólera na voz, ela narra detalhadamente uma história acontecida durante seus anos escolares, quando Fiona foi desprezada por um grupo de garotas populares e Shameika, uma colega de classe que a artista pensava ter inventado, a confortou dizendo que ela tinha potencial.
O que poderia ser mais uma história clichê de ensino médio estadunidense se torna uma obra nas mãos de Fiona, que mistura essa história a acontecimentos de sua vida adulta e transforma “Shameika said I had potential”, uma frase tão simples, em um refrão tão marcante para nós quanto foi para ela.
Fetch the Bolt Cutters foi considerado o melhor disco do ano por diversos veículos especializados (incluindo o Audiograma) e não recebeu indicações para as principais categorias do Grammy. Premiar Fiona Apple nas três categorias onde ela foi indicada é o mínimo que os votantes podem fazer para compensar esse erro.
Afinal, ela tem uma visão muito específica do que gostaria de fazer com o gramofone dourado.
Com apresentações de Brittany Howard, HAIM, Taylor Swift, Roddy Ricch, Lil Baby, Post Malone e outros artistas, a 63ª edição do Grammy acontece no domingo (14).